REVOLUÇÃO FARROUPILHA - 1835
Os
emigrantes também não conseguiram livrar-se das guerras no novo mundo e todas
as suas tragédias decorrentes. O imigrante Michael Lampert, 26.12.1817, 6º
filho do imigrante Johann Jakob Lampert (e avô no nosso futuro Marechal do Ar
Miguel Lampert), no decorrer da revolução Farroupilha, foi engajado em 07.05.1838
e serviu no exército legalista, por três anos, como soldado sob o comando do Major
Ferdinand August Maximilian Kersting, Comandante da Cia. de Caçadores de
Voluntários Alemães e defensor vitorioso na luta contra os Farrapos que
tentaram tomar Dois Irmãos, reduto legalista e quando Porto Alegre e São
Leopoldo já se achavam em poder deles. Esse militar era irmão de Carlos
Clemente Kersting, nascido em 28.12.1815 em Celle, Hanôver e falecido em
06.02.1899, casado com Maria Catharina Lampert, 4º filho do mesmo Johann Jakob
(Os Emigrantes Alemães e a Revolução Farroupilha, pg. 196 de Germano Oscar
Moehlecke).
Na revolução não faltaram os
desmandos dos Farroupilhas, quando em pequenos grupos, dizendo-se mandatários
dos revolucionários, atacavam as casas dos colonos para "requisitar"
à força, alimentos, cavalos e gado. Não foram poucos os que, revoltando-se no
ato, foram barbaramente trucidados na frente de seus familiares. Livros
históricos os relacionam.
Por sua índole pacata, de
adventícios no novo continente e por atavismo histórico, os emigrantes, com
raras exceções, ficaram sempre do lado da legalidade. O Imperador D. Pedro II
representava a Lei e a Ordem. Era o único capaz de sensibilizar os imigrantes
para a guerra, depois de tantas más
recordações da pátria de origem. Os imigrantes apenas participaram das lutas
fratricidas no sul, quando seus lares e bens foram atacados e violados pelos
revolucionários. Venceram todas as revoluções pelo lado do Império e da
República. É interessante ver que no RS quem festeja as revoluções são os
perdedores. De uma delas, festeja-se a data do início, 20.9.1835, mas não a
data do fim melancólico, com um arremedo de
acordo honroso, em 28.2.1845. Esse acordo foi assinado apenas
por 26 oficiais Farrapos, que enumeravam suas aspirações para a conclusão da
guerra. Era conseqüência implícita das exigências do Império: Os Farrapos
deviam dar por encerrada a aventura da república; Os Farrapos aceitavam a monarquia
constitucional vigente e reconheciam D. Pedro II como chefe supremo do Brasil,
e o Imperador anistiava os insurgentes. A República Riograndense, nos seus nove
anos vida, jamais foi reconhecida no conserto das nações. Nem o vizinho Uruguai
a reconheceu como país. Em verdade, a República, durante seus nove anos
existência, foi diminuindo de território, à cada ano, até restar apenas um
pequeno reduto em torno de Alegrete, junto à fronteira com o Uruguai e a
Argentina.
Os Farrapos perderam a revolução no
mesmo dia da eclosão da revolta, ao tomar
e não conseguir manter mais do que poucos
dias suas tropas nos portos de Rio Grande e São José do Norte, única saída para
o mar e decisiva para manter as tropas do império afastadas do território
gaúcho. O porto igualmente era necessário para a exportação do charque gaúcho,
que teve asfixiada sua atividade pastoril-industrial, reduzindo o preço do gado
para um pouco mais de nada. Perdido o porto, perdida a revolução. Outro erro
imperdoável foi permitir a fuga, por barco fluvial, do Presidente da Província.
O governo não foi deposto, apenas trocou de endereço. A capital passou a ser
Rio Grande.
Segundo o manifesto de Bento
Gonçalves, a revolução tinha como objetivo afastar o Presidente do Estado, por
má e odiosa administração e restaurar o império da Lei, mas mesmo depois de ter
sido trocado o Presidente da Província, a revolução prosseguiu em seu destino.
Em todo o Brasil, incluindo o Rio
Grande do Sul, na época da monarquia, a população gozava de todas as liberdades
e direitos possíveis. Havia uma Constituição em vigor, respeitada por todos e a
população, pelo voto partidário e livre, escolhia os seus representantes no
legislativo. Os gaúchos eram dirigidos pela aristocracia latifundiária e
escravocrata.
Quando foi deflagrada a revolução
Farroupilha, o Rio Grande do Sul desfrutava de grande prosperidade. Sua
principal atividade pecuária, a criação de gado era altamente valorizada pela
produção de charque, destinado à alimentação dos milhares de escravos mantidos
nos estados leste-setentrionais do Brasil. Assim, nunca poderia ser objetivo
dos Farrapos a abolição da escravatura, que somente levaria sua única produção
pecuária à prejuízos, pois perderia os compradores de charque. Escravo liberto
jamais iria comprar charque para sua alimentação. A escravatura no RS atingiu o máximo de sua
abjeta existência, justamente nos estabelecimentos degradantes de abate de gado
bovino e sua transformação em charque. Já o escravo do estancieiro, cavalgava e
trabalhava em lides campeiras ao lado de seu dono, comia a mesma comida, corria
os mesmos riscos no trabalho e cumpria, no mínimo, o mesmo horário. Nas
revoluções, voluntário ou não, era convocado ao serviço militar sob as ordens
de seu amo e lutava com igual valentia. No calor da refrega, era matar ou
morrer.
Os Farrapos não obtiveram nada do que serviu
como pretexto para a revolução. Ficou no mesmo o valor do imposto na exportação
do charque, perderam a independência e a república, e não obtiveram a alforria
dos escravos que lutaram ao seu lado.
Bastava um ato de vontade, mas não alforriaram nem seus próprios
escravos. Bento Gonçalves, falecido pouco depois do término da revolução,
deixou em seu espólio, como herança, 33 escravos, entre eles, companheiros de
luta. Conseguiram apenas que o imposto sobre o charque importado do Uruguai
fosse elevado para 25%, o que melhorava as condições de competição, e o direito
de indicar o presidente da província, já existente antes da revolução, que
acabou recaindo sobre Caxias, que havia sido o mentor dos últimos movimentos militares
que tiraram por completo as condições dos Farrapos continuarem resistindo por
mais tempo e construtor das condições amenizadas que deram fim ao movimento
guerreiro. Caxias cedeu aos Farrapos muito mais do que estava autorizado a
fazer, assim como David Canabarro concedeu ao Império muito mais do que o limite
imposto por seus companheiros Farrapos. Sem a menor dúvida, o Império
necessitava ter novamente em suas fileiras os militares revoltosos que com
destemor, o haviam enfrentado, de igual para igual, durante quase dez anos. Eram
insubstituíveis. Mas a paz foi feita graças à esses dois patriotas e transigentes brasileiros. Ninguém reclamou.
Uma das causas Implícitas que
originaram a revoluçãofoi a notícia que seria cobrado pelo Império um imposto sobre
as terras dos pecuaristas. O imposto territorial, segundo o padre Amstad, seria
no valor anual de dez mil reis por légua quadrada (4.356 ha ), valor
irrisório, além da informação que maiores medidas seriam tomadas para coibir o
contrabando de gado e mercadorias com o Uruguai. Não havia causas econômicas
locais. A proximidade com o Uruguai, a existência de fronteiras secas e tendo
brasileiros como grandes proprietários de terras no norte de Uruguai,
necessitava de liberdade de passagem de gado e mercadorias contrabandeadas
entre os dois países. A quebra dessa liberdade (não chamamos esta atividade de
crime) contrariava um costume arraigado. A prática não aviltava o bom nome dos
envolvidos e era aceita com naturalidade por toda a sociedade da época.
A abolição da escravatura em 1889 foi
a causa econômica que deflagrou a revolução de 1893, quando então sim, pela
falta de compradores do nosso charque, as terras de pecuária e o gado bovino
perderam substancial valor, além de novo arrocho à prática do contrabando.
Já tarde demais, Bento Gonçalves
lamentou a falta de um porto e a inexistência de navios de guerra suficientes
para contrabalançar a armada dos imperiais. Bento Gonçalves, após o desastre
militar na ilha do Fanfa, onde todo o seu exército, foi aprisionado, inclusive
ele próprio. Quando se encontrava preso
em fortaleza do Rio de Janeiro, recebeu a visita de Giuseppe Garibaldi e com
ele contratou o estabelecimento de corso para atacar os navios mercantes do
império, mediante o recebimento de um terço da carga pilhada do navio atacado,
como forma de pagamento (Garibaldi e a guerra dos Farrapos, de Lindolfo
Collor), não ajudou o suficiente. Foi o único corsário em atividade nos mares e
nas águas interiores do Brasil. A busca de um porto marítimo levou os Farrapos
à aventura que terminou no fracasso de tomar e manter Laguna (SC) e criar a
República Juliana. Durante algum tempo, Garibaldi utilizou o porto para abastecimento
do Seival para as atividades de corso. A resposta do Império não demorou. Ou
afundava o Seival ou tomava o seu porto de abastecimento. Fez os dois. Uma
frota de navios de guerra do Império irrompeu pelo canal de acesso ao porto e
derrotou mais uma vez os Farrapos, afundando o Seival que lutou corajosamente
até o fim. Foi a pique na única batalha que participou. Gloriosamente, afundou
crivado de balas e com seus canhões vomitando fogo sobre os imperiais até o
último cartucho. Seu parceiro de travessia terrestre, o Farroupilha, já havia
naufragado em temporal na viagem de
Tramandaí à Laguna. Este navio de guerra afundou sem jamais ter disparado um
único tiro de canhão. Estes heróicos riograndenses não sabiam lutar em batalhas
convencionais e estáticas, nem manobrar navios de guerra ou atirar com
eficiência com os canhões postados na periferia do porto e no canal de acesso.
Seu lugar de combate era a coxilha do pampa. Retornaram ao Rio Grande do Sul,
desfalcados de seus soldados e desiludidos com o esforço despendido em vão.
Acabaram odiados pelos Lagunenses que tinham ido auxiliar. Em poucos meses,
acabaram sendo execrados pelos seus habitantes que inicialmente os receberam
como salvadores. A tomada do porto de Laguna asfixiou o comércio e empobreceu a
população local. A própria idéia do uso do porto de Laguna para as exportações
gaúchas não tinha qualquer viabilidade prática de êxito. Único saldo positivo
da aventura, foi o surgimento de Anita Garibaldi, nossa heroína de dois
mundos.que teve um filho nascido em Mostardas no RS. Numa época que a mulher sempre era sempre
submissa, ela, com muita coragem, rompeu com seu casamento infeliz, enfrentou o
preconceito local e foi viver seu amor e sua aventura com Garibaldi.
Mais tarde, os Farrapos tentaram
tomar o porto de São José do Norte. Cavalgaram quase trezentos quilômetros pela
orla do Atlântico, sem ponto de apoio, pela via que até hoje é chamada de
Estrada do Inferno, onde só tem mar, areia, solidão e tristeza. Garibaldi levou
junto consigo Anita, grávida de sete meses, que ficou abrigada na choupana de
um morador dos arredores de Mostardas até o nascimento de seu primeiro filho. Um
desafio aos mais valentes. Passaram,
num inverno gelado e chuvoso, todas as agruras possíveis, que culminaram em
mais uma derrota. A armada imperial de Rio Grande prestou socorro aos
defensores de São José de Norte e foi fator decisivo na batalha.
Sempre a história é contada pelos
vencedores, mas no Rio Grande do Sul, a história é contada com orgulho pelos
vencidos, que cultuam seus heróis, alguns controversos, omitindo os nomes dos
vencedores.
Ficou
para sempre a memória da epopéia da revolução, a bravura e o cavalheirismo de
todos os seus participantes. Foi uma revolução sem degola de prisioneiros.
Os colonos tinham uma visão
diametralmente oposta à dos estancieiros, protagonistas da revolução, inicialmente
de reivindicações, seguida de desafio à autoridade por mudanças na
administração pública, e posteriormente, separatista e republicana. Os colonos
do RS não foram contagiados pela histórica vocação oposicionista e rebelde do
nosso estado, que se perpetua até hoje. A cidade de Porto Alegre recebeu com
apatia inicial a vitória local dos Farrapos. Apenas aceitou a dominação
Farroupilha. Tomada à força, em menos de nove meses livrou-se do invasor, que
apesar de sitiá-la por largo período de quatro anos, nunca mais voltou a
ocupa-la. Nestes quatro anos, a população teve as suas necessidades e sua fome
saciadas unicamente com o fornecimento de gêneros alimentícios trazido pelos
colonos alemães de São Leopoldo, que, por via fluvial tinham acesso à cidade.
Os Farrapos conquistaram a cidade mas não tomaram nenhuma medida de acionar o
comércio e evitar a estagnação das atividades econômicas. Não emitiram moeda e
as que giravam na praça foram logo entesouradas, deixando a população sem
possibilidades de sobrevivência econômica. O episódio da retomada de Porto
Alegre, iniciada por um Major do Império, imigrante alemão, Henrique Guilherme
Mosye com apenas mais três militares legalistas que se evadiram no mesmo dia,
mostra que estes tinham a adesão da população. Por este motivo é que Porto
Alegre recebeu do Império o título de mui leal e valorosa, ostentado até hoje
com orgulho. A cidade homenageia com uma estátua eqüestre o general Bento Gonçalves, mentor da revolução, e que
foi, durante quatro anos, o algoz que comandou o sítio infrutífero de Porto
Alegre, que suportou estoicamente o cerco férreo, até que os sitiantes
desistiram e se retiraram derrotados. Bento Gonçalves da Silva, pelos seus
valores e desempenho pessoal, projetou-se historicamente à condição de maior
herói do RS.
Não encontramos qualquer referência do
que era feito com os prisioneiros da guerra. Não foram assassinados e não havia
instalações para mantê-los fora de novo engajamento com os inimigos. Em nosso
entender, eram soltos ou apenas trocavam de lado. Se fosse necessário, em uma
batalha próxima trocariam outra vez de partido. Ser monarquista ou republicano
não fazia qualquer diferença para o convocado analfabeto. Se um General trocou de lado quatro vezes,
porquê um soldado não poderia fazer o mesmo?
A história da revolução farroupilha
não necessita de omissões, mitos, inverdades e distorções para que continue
sendo a maior e duradoura epopéia do Brasil, que marcou a identidade dos
gaúchos para sempre e delineou o nosso imaginário. Basta a verdade nua e crua para que
permaneçamos apaixonados e orgulhosos pelos episódios épicos do decênio 35 a 45.
GUERRA DO PARAGUAI - 1865
Uma geração mais tarde, na guerra do
Paraguai, encontramos a menção de dois Lampert no livro "Alemães e
Descendentes na Guerra do Paraguai", do Dr. Klaus Becker. Clemente e Karl.
Encontramos dificuldades para identificar Clemente Lampert, soldado, desertor,
reengajado e retornado da guerra. Existiram dois. Um, Clemens Lampert, seleiro,
06.01.1844 e 21.04.1926, quinto filho do emigrante Johann Friedrich (1º filho
de Johann Jakob Lampert), e outro, Klemens Lampert, 25.12.1845, filho mais
velho do emigrante Michael, 6º filho, o mesmo da revolução Farroupilha. Os dois
teriam cerca de vinte anos no início da guerra (1865/1870). Ambos casaram e
tiveram filhos. Verificamos, obtendo as datas de nascimentos dos filhos do
primeiro e que quatro deles nasceram
durante os cinco anos de guerra com o Paraguai. Restou, por conseqüência o
segundo, casado com Catarina Niderauer, que teve seu primeiro filho somente em
1880, já terminada a guerra e quando tinha 35 anos de idade..
No mesmo livro, página 189, temos
Karl Lampert, sargento, nascido na Picada 48 em Dois Irmãos, morto em combate
na cruenta batalha da tomada do forte Curuzu, no Paraguai, em 01.08.1866. Era o
único filho varão sobrevivente de Johann Adam Lampert, 1ª emigração, 2º filho e
nasceu em 22.07.1846. Serviu no 1º Corpo Provisório de Caçadores a Cavalo.
Os dois soldados eram primos-irmãos
e acreditamos que a deserção tenha se verificado após a carnificina de Curuzu,
com grande número de mortos brasileiros e paraguaios. As deserções eram comuns
também pela absoluta falta de alimentação. Consta que um grupo de soldados
sobreviveu um mês na mata, alimentando-se apenas de palmito.
Mais de 700 soldados descendentes de
alemães foram à guerra do Paraguai e apenas 10% retornaram incólumes. O
reengajamento após a deserção era comum e ninguém foi punido. Numa das igrejas
pesquisadas (Dois Irmãos), encontramos o registro, num único dia, do
falecimento no Paraguai de cinco jovens da comunidade. Pode-se imaginar o abalo
ocorrido na pequena vila. Mas não ficaria nisso. Dos mais de quarenta jovens soldados
de Dois Irmãos apenas três voltaram incólumes do Paraguai.
Igualmente, constatamos haver um
tenente Wilhelm Blauth, casado com Elisabetha Lampert, 3º filho da 2ª
emigração. Também deve ter atuado na guerra do Paraguai.
Convém lembrar que na guerra do
Paraguai havia voluntários e "voluntários". Uns, ao ver a pátria
ameaçada se apresentaram espontaneamente. Outros foram engajados, alguns à
força, mesmo casados e pais de prole numerosa. Também havia os que, uma vez
convocados, pagavam para terceiros, em dinheiro e mediante contrato, e esses
assumiam o seu lugar nas fileiras. O que era aceito pelo exército. O valor pago
ao contratante era cerca do soldo de um praça durante três anos. Não era pouco.
Geralmente a metade no ato, e o restante na volta da guerra ou de notícia de
seu falecimento, quando o saldo seria pago à família do soldado morto. Nessa
época, já era proibido aos colonos possuir escravos, o que os impedia de
enviá-los em seu lugar. Havia
ainda outros voluntários que cabe mencionar. Assim como era permitido pagar à
alguém tomar seu lugar nas fileiras do exército, existia também a possibilidade
de, mediante autorização do Senhor Visconde da Província e Comandante das Armas
e comprovando razões de arrimo, apresentar um escravo seu para substituí-lo. Deveria, no ato, alforriar o negro ou pardo.
Este, obedecendo à vontade de seu dono, e provavelmente, também com satisfação,
pois passaria a ser homem “liberto” (não confundir com “livre”), ficando
subordinado às leis militares até o fim das hostilidades com o Paraguai, quando
então daria baixa do exército e seria um brasileiro, com alguns direitos
inferiores aos cidadãos livres. Esta hipótese, mesmo envolvendo risco de morte,
deveria ser melhor do que continuar escravo até a velhice, quando seu trabalho
não pagava sequer sua alimentação, era alforriado e jogado na rua.
Temos em mão certidões do Arquivo
Histórico do Rio Grande do Sul como testemunho do obtido por um dos nossos
antepassados Kruel.
Cabia ainda ao escravo com aptidão e
idade para ir à guerra, pedir seu engajamento, obtendo a alforria ao ser aceito
nas fileiras militares. Decreto Imperial de 6 de novembro de 1866 concedia
alforria aos escravos dispostos a lutar na guerra do Paraguai.
Numerosos contingentes de
brasileiros enviados à guerra, não tinham qualquer formação militar e teriam
que aprender a lutar, sobreviver e vencer, diretamente nos campos de batalha.
A alcunha de macaquitos nos foi
imposta pelos jornais militares paraguaios que eram distribuídos à tropa, pelo
exagerado número de soldados negros encontrados. Nesses mesmos jornais, vêem-se
charges publicadas, onde os soldados brasileiros eram apresentados como sendo
todos negros e parecidos com macacos.
No exército que lutou e venceu no
Paraguai, alem de uruguaios e argentinos, havia brasileiros de ascendência
lusa, ex-escravos e em menor número, descendentes de alemães de primeira
geração, já brasileiros por nascimento. Estes últimos, em parte, tinham um
apelido único. Nosso avô Leopoldo nos contou que eram chamados de alemão de
merda quando seus superiores não conseguiam pronunciar o seu nome corretamente.
Como poderiam chamar alguém de Brodbeck, Droberhard, Fehsenbeck, Sparrenberger,
Wickenhagen e outros sobrenomes que encontramos nas relações dos soldados de
origem germânica? Os soldados aceitavam divertidos a alcunha, que revelava, em
conclusão, a pouca cultura de alguns dos seus superiores.
Os
voluntários de origem alemã serviram na artilharia e na cavalaria. Vários deles
registraram em diário, as peripécias de suas participações na guerra sob o seu
ponto de vista, inclusive em verso. Esses registros estão no livro do Dr. Klaus
Becker, anteriormente citado e conclui-se que em alguns detalhes, diferem
parcialmente do relatado nos livros oficiais sobre a guerra do Paraguai. Muitos
foram agraciados com promoções e medalhas pelo heroísmo demonstrado na
campanha. O Karl Lampert, morto em combate, já era sargento aos 20 anos.
OS MUCKER - 1872
Entre as anotações genealógicas de
nosso pai havia um registro lacônico “No tempo dos Mucker havia em Sapiranga um
Jacob Lampert. Não sei quem era”.
Partimos em sua busca e o
encontramos. Era Jacob Lampert, 1838-1891, segundo filho da primeira emigração.
Casou-se no Brasil com Hanetta Carolina Schüssler e deixou enorme descendência.
Os episódios que culminaram no
massacre dos adeptos de Jacobina Mentz Maurer ocorreram entre 1872 e 1874 e são
por demais conhecidos.
Quando em conflito social, um grupo
que fanatiza-se gera também uma reação contrária com grau de fanatismo similar.
Os Lampert eram contrários aos
Mucker e Jacob (com o sobrenome de Lambert) foi citado no livro “O episódio do
Ferrabrás” de Leopoldo Petry na pg. 142, nas justificativas de João Jorge
Klein, um dos Mucker iniciais mas que não participou dos combates. Ele acusa Jacob, entre outros, de
ter invadido sua residência, destruído e roubado bens de sua propriedade.
Como o depoimento foi tardio, em
23.4.1912, de um fanático que desejava se justificar e o acusado já havia
falecido, seu teor deve ser encarado com reservas, mas sabia-se que a própria
polícia local incitava hostilidades contra os Mucker pela simples razão de que
eles eram diferentes e odiados.
Para um colono germânico, uma das
maiores afrontas consistia em ter seus bens, ainda que banais, furtados ou
destruídos ostensivamente por pessoas que sabiam de antemão que nada lhes ocorreria
com as autoridades constituídas. Não adiantava encaminhar queixas. Isto
provocava um ódio mortal.
Os Mucker, de tão perseguidos,
encaminharam uma petição a D. Pedro II solicitando providências, levada em mãos
ao Imperador por uma comissão constituída dos adeptos de Jacobina Mentz Maurer,
que incluía o marido dela, João Jorge Maurer. Viajaram durante dois meses. A
burocracia do Império encaminhou a petição para a informação do delegado de
Polícia de São Leopoldo, que havia nomeado o sub-delegado Spindler. Provocou
ainda mais perseguição e o requerimento não deu em nada.
Na época, era subdelegado de polícia
em Sapiranga, Georg Christian Spindler, encarregado de várias diligências nas
denúncias contra os Mucker. Logo ficou odiado e depois de que a casa comercial
de Jacob Schmitt foi incendiada, iniciou-se uma perseguição que nunca mais teve
fim. O comerciante atingido era casado com Wilhelmine Spindler filha do subdelegado.
Era a vingança dos Mucker. Outra autoridade local, o inspetor de quarteirão do
primeiro distrito, Johann Lehn, auxiliar de Georg Christian Spindler,
igualmente, realizou diligências legais contra os mesmos denunciados. Pode-se
imaginar o resultado, levando-se em conta a solidariedade ao seu chefe.
Jacob Lampert teve o seu quarto filho,
Carl Joseph, casado com Maria Emílie Spindler. Este Carl Joseph teve somente
dois filhos. O mais velho, Carlos Emílio, foi casado com Metha Lehn e a filha
mais nova, Bertha, foi casada com Edmundo Spindler. Por estes sobrenomes, é
fácil avaliar que Jacob Lampert, ferrenho acusador e inimigo dos Mucker, tinha incentivo e
cobertura das autoridades policiais da localidade, seus parentes.
Possuímos os quatro livros
históricos sobre os Mucker e em análise pessoal, concluímos que colonos pacatos, marginalizados, semianalfabetos
e obstinados, foram
conduzidos ao fanatismo religioso
e levados ao paroxismo do ódio contra os que os hostilizavam,
até que reagiram com explosões de violência inaudita e com valentia
suicida. Aceitaram de antemão seu
sacrifício e morte em luta desigual, que não tardaria, contra as autoridades,
em defesa do legítimo direito de rezar da maneira que bem entendessem ao mesmo
Deus de todos.
Falava-se em exército dos Mucker,
mas seu número não passou de um pouco mais de 30 famílias de agricultores
bisonhos.
No combate final entre 150 soldados
do exército e os 22 remanescentes Mucker, praticamente desarmados, todos foram
chacinados sem piedade em confronto desproporcional em número e qualidade de
armamentos. Foram em seguida desnudados. Suas roupas foram roubadas, e se
verificou que dois dos “soldados” Mucker eram mulheres, entre elas Jacobina.
Uma estátua homenageia no local o
militar que comandou as ações, foi ferido no pé e faleceu em conseqüência de
falta de atendimento adequado. Um herói???
Hoje, constatamos em Sapiranga, a
existência de uma rua chamada Jacobina,
no bairro denominado Ferrabrás. Um resgate à história de uma vítima da
intolerância.
A comunidade de origem alemã ficou
para sempre marcada pelos horrores ocorridos e este conflito foi apenas o
prelúdio de outro que ocorreria anos depois e em maior escala em Canudos (BA) e
pelos mesmos motivos.
Em nossa infância, esporadicamente,
ouviam-se ainda boatos que um exército
Mucker invadiria a cidade, mesmo já decorridos mais de 60 anos dos fatos
do Ferrabrás e seu quase extermínio. Pessoas desinformadas entravam em pânico.
Cremos que a base dos boatos era originária do fato dos remanescentes Mucker
que não estiveram presentes no combate e chacina final, terem migrado para a
localidade de Terra dos Bastos, Marques de Souza, no interior do município de
Lajeado, onde, ainda por muitos anos seus infelizes descendentes foram
hostilizados e um deles, acabou
trucidado pela população
descontrolada. Jacob Gräbin,foi apontado
como assassino de uma mulher e por isto, linchado. Anos mais tarde, no leito de
morte, o marido da vítima confessou ter sido ele o assassino. Só então o ódio e
as hostilidades chegaram ao fim.
Meio século após os incidentes, a
palavra Mucker ainda inspirava temores sem fundamento. Recentemente, quando da
emancipação de vários distritos de Lajeado, um descendente dos Mucker elegeu-se
prefeito.
Jacob Lampert não passava de um
chefe de família correto e homem pacato que foi envolvido, sem poder evitar, no
torvelinho dos lamentáveis acontecimentos do Morro do Ferrabrás. Não havia
outra opção. Estava-se de um lado ou estava-se do outro.
Ainda sob o calor dos acontecimentos
finais, a população, aliviada, mas ainda amedrontada, enviou ao comando militar,
um abaixo assinado agradecendo a intervenção do exército. Colonos que tinham os mesmos sobrenomes dos
envolvidos,apressaram--se em assina-lo. Entre eles, identificamos um irmão e um
cunhado de uma das vítimas Mucker, parentes de familiares nossos pelo lado
materno.
REVOLUÇÃO FEDERALISTA
- 1893
Ainda uma geração mais tarde, foi
numerosa a participação dos descendentes dos imigrantes na revolução
Federalista em 1893, que procurava recuperar a hegemonia econômica e política
dos estancieiros, aos poucos perdida e nunca mais recuperada. Também os Lampert estiveram presentes.
Leopoldo Lampert, nosso avô, nos contava quando éramos meninos, sua
participação em combate juntamente com um de seus irmãos na luta fratricida,
que pela sua selvageria sem similar em nossa história, é mencionada com vergonha
e sem maiores detalhes pelos historiadores gaúchos. Nessa revolução, parece que
foram esquecidas as tradições de cavalheirismo e respeito pela vida dos
soldados capturados vivos pelas facções em luta. Após os combates, em grande
número, mesmo tendo se rendido com garantia de vida, sob palavra de honra,
foram covardemente degolados. A história responsabiliza o uruguaio Adão Latorre
pelo início e efetivação da degola, autor de mais de 300 num único dia, talvez
por ser negro e estrangeiro. Se ele demorasse apenas cinco minutos para
realizar uma degola, levaria 25 horas de “serviço” contínuo, sem tempo para uma
refeição, sono ou uma chegadinha à moita. É óbvio que não “trabalhou” sozinho.
Estima-se que o número de vítimas da degola em ambos os lados, supere
2000. Jamais encontramos palavras de
Silveira Martins ou de Júlio de Castilhos, condenando estes atos de seus
subordinados. Afinal, a tropa maragata
tinha ou não tinha um comandante que determinasse o cumprimento dos termos do
acordo de rendição sob palavra de honra, no combate do Rio Negro?
Um vizinho da propriedade rural de
nosso avô, onde tinha um haras e criava cavalos puro sangue inglês para prado e
cancha reta, em Itaipava dos Ramos, hoje município de Cruzeiro do Sul, era
apontado como sendo um dos degoladores do combate do Rio Negro e por ele
marginalizado.
Quando se trata de política
partidária, em nosso Estado, a palavra de honra ou o fio de bigode perdem a
substância que habitualmente possuem.
Brasileiros de outros estados, ao
chamar os gaúchos de bárbaros e sanguinários nos infundem indignação, mas não
deixam de ter alguma razão histórica.
Os revolucionários nunca pretenderam
alojar os soldados capturados vivos, pois não tomaram nenhuma iniciativa de
criar um local que os acolhesse e mantivesse em segurança sem que voltassem
tomar armas e combater novamente. A degola não tem similar no Brasil e é única
ocorrência nos últimos séculos de história universal.
Esta revolução também ja nasceu
morta, pois os maragatos não possuíam transporte rápido, nem logística, nem
armas de fogo automáticas e nem meios de comunicação. Os chimangos ou pica-paus
tinham nas linhas de trens um transporte veloz, logística eficiente e
comunicações via telegrafo. Isto forçou os revolucionários à procurarem
sobreviver longe dos caminhos dos trens. Atropeladas heróicas de lanceiros, na
época, poderiam vencer batalhas, mas jamais ganhariam guerras. Na verdade,
tiveram sempre as forças do governo em seu encalce, que nunca lhes deu trégua.
No decorrer da contenda, nosso avô
descobriu que outro de seus irmãos era soldado revolucionário - o único
maragato da família - e perdeu por completo o entusiasmo. Não conseguimos comprovar se ele era mesmo um
soldado federalista ou simplesmente um partidário político. Era um exímio atirador e pela Ordem do Dia nº
6, sentou praça na 3ª Cia. do 101º batalhão, e incluído na força em 9 de
janeiro de 1894. Ainda durante a revolução deu baixa no exército sob a alegação
de "dificuldades visuais". Foi excluído pela Ordem do Dia 132, em 2
de julho de 1894. Serviu durante seis meses.
Não entraria em combate contra seu irmão. Tinha se alistado
voluntariamente no exercito legalista. Era um batalhão de elite e apelidado de
“batalhão mimoso”. Em 1913 foi nomeado
Tenente Coronel Comandante do 259º Batalhão da Guarda Nacional, título
honorífico. Também nessa revolução os colonos somente se engajaram após terem
os revolucionários praticado atos de violência contra pessoas e propriedades.
Depois de muita procura, enfim,
descobrimos qual dos seus irmãos foi seu companheiro de revolução, ainda que
não na mesma unidade. Amândio Fidêncio Lampert,
quatro anos mais velho, tinha 25 anos de idade e ao eclodir a revolução
maragata era ainda solteiro, tendo se casado com sua sobrinha Hercilia Lampert
somente após encerradas as hostilidades.
Residia em Ijuí onde era comerciante. Abandonou a atividade comercial
para incorporar-se às forças armadas castilhistas, no 4o. corpo da 5a.
brigada, da legendária e aguerrida
divisão norte, sob o comando de Pinheiro
Machado. Atingiu a posição de coronel.
Estas tropas acossaram implacavelmente, durante meses, as forças maragatas que
eram chefiadas em pessoa por Gumercindo Saraiva, inconteste líder militar.
Sempre ao encalço de Gumercindo e seu exército, atravessaram o Rio Grande do
Sul, Santa Catarina e ingressaram no Paraná, sem que os maragatos aceitassem batalha
definitiva com os castilhistas, superiores em efetivo e armamento. Limitavam-se
à escaramuças entre vanguarda de um lado
e retaguarda de outro. Obrigado pelos acontecimentos guerreiros, Gumercindo
retornou ao Rio Grande do Sul e um tiro isolado acertou o guerrilheiro, quando
este, à cavalo, parado sobre uma
coxilha, procurava visualizar a melhor posição para um ataque de cavalaria a
ser realizado e comandado por seu irmão Aparício. O tiro que o matou, também
feriu mortalmente a revolução. Desmobilizado.
Amândio Fidêncio fixou então residência em Montenegro, onde foi
prestigiado líder político republicano, prefeito eleito por duas vezes e amigo
pessoal de Júlio de Castilhos e Carlos Barbosa. Encontramos os resultados das
duas eleições. Em 1908 teve 2.452 votos contra apenas 2 de seu opositor. Em
1912, teve 3.134 votos e seu contendor, se é que existiu, sequer foi
mencionado. Em 1901 foi fundador, juntamente com seu irmão Frederico Gabriel,
do jornal local “O Progresso”, que t eve larga duração. Até 1910 manteve uma secção editada em
alemão.
E quem era o terceiro irmão, soldado
federalista? Não encontramos qualquer documento ou tradição oral na família.
Nosso avô nos informou, mas esquecemos seu nome. Acreditamos que tenha sido
Ernesto Leopoldo Lampert, nascido em 1854 em Taquari, por exclusão dos demais.
Era o único maragato na família. Contraiu núpcias na região pastoril em São
Martinho, região de Santa Maria e centro
do Estado, e dedicou-se à atividade pecuária.
Pelos seus interesses e região de maragatos, era o único dos irmãos que,
cremos, se inclinaria a enfrentar Júlio de Castilhos e mesmo sem o saber, seus
outros dois irmãos. Por ocasião da revolução, já tinha 39 anos. Não deixou
informações para seus descendentes, talvez pelo insucesso da revolução e para
evitar perseguições aos vencidos. Casou depois de terminada a contenda, com
noiva 20 anos mais jovem e o casal teve seu primeiro filho somente em 1897,
fato que sugere o acerto de nossa dedução.
Anos mais tarde, tivemos juntamente com nosso
pai, a oportunidade de visitar a antiga propriedade rural do grande caudilho
Gumercindo, no local denominado Curral de Arroio, logo ao norte de Santa
Vitória do Palmar e sentir o orgulho dos atuais proprietários com o passado de
Gumercindo. .
De todas os personagens dessa
Revolução, para nós, curiosos em história, encontramos em Gumercindo Saraiva o
protótipo do herói autêntico. De pouca cultura e formação política, nascido em
Santa Vitória do Palmar, às margens da lagoa Mirim, era um líder nato e logo
tornou-se famoso pelas suas táticas de combate de guerrilha, sempre
imprevisíveis pelo inimigo e a quem infligiu severas derrotas. Seus homens se encantavam com sua
simplicidade e liderança e o seguiam, se necessário até à morte, empolgados por
combater ao seu lado. Nascido no Brasil e criado no Uruguai, onde nasceu seu
irmão e companheiro de revolução, Aparício. Ambos só falavam portunhol.
Em muitos lugares, os colonos armaram-se por
conta própria e defenderam-se com sucesso contra ataques de um número muitas
vezes maior do que eles e sem o auxilio da polícia ou do exército. Em Santa
Clara do Sul, no então município de Lajeado, um marco comemorativo registra o
local da façanha. Cinqüenta colonos (entre eles quatro de sobrenome Ruschel,
primos de nosso avô Mathias Ruschell Sobr.),contra mais de trezentos maragatos serranos. (Santa Clara - livro de
Theodor Firmbach). Em nosso entender, muito mais simples salteadores do
que revolucionários, acompanhados pelo também colono e
maragato audacioso, coronel José
Altenhofen, de Estrela, promotor de
várias escaramuças e degolas de prisioneiros no vale do rio Taquarí
e mencionado com elogios por Ângelo Dourado, na pg. 258 do seu livro
“Voluntários do Martírio”, com o nome de Altinoble. Após a revolução, em sua
propriedade rural, ao resistir à prisão por atos desordeiros e agressão à
vizinhos, acabou morto à pauladas pelos
policiais que o foram prender.
Até hoje, na região, se fala na “Maragaten
Krieg” (Guerra dos Maragatos). Como poderiam 50 pacíficos colonos derrotar a
horda que se aproximava? As razões são lógicas. Liderança confiável de José
Diehl e defendiam seus bens e famílias com a coragem dos desesperados. Já
estavam enraivecidos por impunes assaltos e roubos anteriores, vigiaram os
passos dos inimigos sem que estes desconfiassem e iniciaram o tiroteio de
surpresa. Armaram-se com fuzis de última geração e qualidade superior e,
especialmente, procuraram o melhor lugar para a defesa. No local escolhido, uma
pequena curva em S e em aclive, numa estrada estreita, com as laterais de mato
fechado, receberam os maragatos montados com uma saraivada de chumbo. Iniciado
o tiroteio, os invasores tiveram de refluir morro acima, atrapalhados pelos que
ainda vinham descendo e desconhecendo quem e quantos os atacavam. Após horas de
combate, fugiram apavorados, levando seus mortos e feridos. Nunca mais
voltaram. Com essa vitória e apenas um ferido, os colonos livraram-se também da
“proteção” das forças legalistas, com as inevitáveis requisições e
rapinagens.
Doamos com satisfação para o museu da Prefeitura daquele novo município
o último dos 17 fuzis originais existentes, da marca Comblain, de retrocarga,
utilizados naquele combate, que os colonos adquiriram às suas expensas, em
Porto Alegre, diante das contínuas ameaças e ataques dos revolucionários. O obtivemos por permuta com Aloysio
Schneider, um dos descendentes dos colonos, que nos procurou pedindo informações
onde poderia mandar broqueá-lo e transformá-lo em arma de caça. Já conhecíamos sua história e nos propusemos
a dar em troca uma arma igual à desejada e não aceitamos compactuar com o
sacrilégio da destruição de uma relíquia histórica. Esta arma fazia parte de um
pequeno museu que possuíamos iniciado em 1960. Para termos uma idéia, estas
armas foram fabricadas em 1892 na França e eram as mais modernas no mundo da
guerra até então. Seu poder de fogo e precisão
era o que havia de melhor. A maior parte dos beligerantes, incluindo-se os demais
33 colonos, utilizava ainda trabucos e armas de carregar pela boca.
Por imposição legal, nos desfizemos
de todas as armas de fogo de nossa coleção e hoje mantemos somente um sabre de
cavalaria, encontrado no rescaldo da batalha e que nos foi doado em Taquari por
descendente de testemunha do combate de 3.5.1840, o maior de toda a revolução
de 35, vencido pelos forças farroupilhas contra os imperiais.
Num túmulo, ao lado do local de
sepultamento dos despojos de nossos pais e avós, no cemitério católico de
Lajeado, está a lápide com a inscrição bilingüe, de despedida e homenagem ao
jovem colono de 25 anos Emil Carrard, nascido em 26 de agosto de 1869 e único
legalista morto no combate contra os
maragatos que tentaram tomar a cidade de Lajeado e foram rechaçados em
17.12.1894. Deixou pais, mulher e filho. Mais um herói que ficou esquecido e
seu túmulo estava em franca decadência e deveria ruir em breve. Sequer foi
lembrado no centenário de seu sacrifício. Com nossa interferência, no início de
2002 seu túmulo foi demolido e reconstruído pela prefeitura municipal de
Lajeado. O mérito pela reconstrução foi creditado à outra pessoa moradora da
cidade. Não importa.
REVOLUÇÃO
ANTIBORGISTA - 1923
Posteriormente, uma geração mais tarde (os
ânimos se exaltavam a cada nova geração), em 1923, quando, em mais uma eleição
fraudulenta o chimango Borges de Medeiros derrotou o candidato maragato da
oposição, Assis Brasil, José Francisco de Souza, esposo de Rosa Lampert, 1ª
emigração, 7º filho de Karl Lampert, 8º imigrante e irmã de nosso avô Leopoldo,
também foi vítima dos horrores da revolução maragata, quando, juntamente com
mais doze companheiros, ia em viagem a cavalo
para Palmeira das Missões, onde receberia cuidados médicos, foi
interceptado pelo legalista Firmino de Paula (comandante da degola de 300
maragatos de represália, em Boi Preto em 1893) e sua tropa. José Francisco era
coronel maragato e todos foram condenados à morte por fuzilamento, no ato.
Morreu sem um lamento. Antes de ser fuzilado em Gramado, hoje distrito de Erval
Seco e na época município de Palmeira, José Francisco conseguiu emitir um sinal
de que era maçom. Não evitou o fuzilamento e a degola posterior, mas salvou a
vida de seus dois filhos, Homero e Edemar Lampert de Souza, que o acompanhavam
e foram salvos por interferência dos maçons legalistas. Esses dois rapazes
assistiram o assassinato do pai e de mais dez companheiros. Posteriormente, os
dois foram enviados como prisioneiros de guerra ao presídio de Palmeira. Dias
depois, foram transferidos para o presídio de Passo Fundo e só então, mais
tarde liberados pelos legalistas. José Francisco deixou onze filhos órfãos. A
informação correta nos foi fornecida por Wilmar Winck de Souza, filho de
Edemar, um dos dois irmãos. Já que não conseguiram anular a eleição, solicitada
ao governo federal, iniciou-se a luta que visava interromper as contínuas
reeleições de Borges de Medeiros mediante o uso de trapaças e quebrar a
hegemonia do Partido Republicano. Após o acordo de paz firmado em Pedras Altas,
iniciou-se um período de relativa honestidade nas eleições, que até então eram
sempre fraudadas e às vezes até inexistentes.
JOSÉ FRANCISCO DE
SOUZA
O voto era aberto, isto é, o eleitor deveria
proclamar seu candidato em voz alta na presença da mesa apuradora e
espectadores. Não era fácil ser oposição.
Às vezes, os mesários assinavam simplesmente a ata e a eleição estava
realizada e apurada. Ninguém tinha coragem para contestar e submeter-se à
perseguição das autoridades. Já a partir de 1924 a oposição ao governo
obteve significativas vitórias na Capital e em cidades importantes no RS.
Entretanto, a honestidade eleitoral não durou muito tempo, já em 1930, como
veremos a seguir, repetiram-se as falcatruas. Como os colonos não foram
ameaçados, pois as muitas tropelias e poucas batalhas se verificaram em lugares
distantes, também dela não participaram.
M A R A G A T O -
Poema
O meu pai foi
maragato
Que peleou em
vinte e três.
É por isso,
talvez.
Que uso lenço
colorado,
Este
estandarte sagrado
Do meu Rio
Grande caudilho
Perseguindo o
mesmo trilho
Que o pai
desbravou pro filho.
O sangue do
meu avô
Pintou de
rubro este chão.
Morto na
revolução
Por ser
contra o despotismo,
Defendendo um
idealismo,
Por pura
convicção.
Calçou o pé
na macega
Nunca afrouxou o garrão.
Por isso eu me
orgulho
Dessa estirpe
maragata,
Que a nossa história
retrata
Ao cultuar a
tradição.
Meu avô, meu pai, meu
filho,
Como eu também
caudilho
E o neto, seguindo o
trilho
Chega à quinta
geração.
E assim fica o
exemplo,
Firmeza e convicção,
Pra que seja
transmitido
Ao capataz, ao
patrão,
Ao soldado, ao
general,
Que a vida é muito
mais bela
Se você passar por
ela
Defendendo um ideal
Vlmar Winck de
Souza – (Provisório) Palmeira das Missões
Neto de Rosa
Lampert e José Francisco de Souza
(juntamente
com Barbosa Lessa, Paixão Cortes e outros, fundador do CTG 35)
Nenhum comentário:
Postar um comentário