REMINISCÊNCIAS
PROFISSIONAIS - 6
OS FRIGORÍFICOS DE SUÍNOS DO VALE DO
TAQUARI
Em 1964 existiam onze abatedouros de
suínos com inspeção federal no Vale do Taquari. Entre Bom Retiro do Sul,
Teutônia, Roca Sales, Lajeado, Arroio do Meio e na sede e distritos de
Encantado. Eram todos de tamanho médio, subordinados a épocas de safra e
entressafra, decorrentes de maior ou menor existência de suínos nos meses de
inverno e verão. Abundância de maio a dezembro e carestia de janeiro a abril.
Os preços dos suínos invertiam essas posições, preços baixos na safra e
elevados na entressafra. A banha, então ainda produto principal, era estocada pelos
fabricantes até meados do verão, aguardando cada ano, a habitual elevação do
preço, que conduzia à obtenção de lucro especulativo. A banha logo teria seu
infeliz destino traçado. Perderia sua principal utilização nas cozinhas pela
troca por óleo vegetal. Quem não alterou a qualidade dos suínos que abateria,
perderia por completo a capacidade de concorrer. Não haveria mais tempo de
fazê-lo. Só tinha um caminho: o fechamento da empresa, com todos seus problemas
econômicos, sociais e desemprego. A carne suína tornou-se o produto principal.
Essa situação não poderia perdurar para
sempre. O suinocultor estava tendo prejuízo e já estava descapitalizado.
Clamava-se ao governo o estabelecimento de um preço mínimo, tecnicamente
inviável. Os produtores, o mercado e a indústria teriam que encontrar a solução
dentro das leis naturais da oferta e procura.
Já
havia sido criada a Associação Brasileira de Criadores de Suínos, da qual
fizemos parte em suas primeiras diretorias. Formou-se um consenso, aceito por
alguns e desprezado por muitos. O tempo iria mostrar.
Para
que houvesse suínos durante todo o ano e que a carne substituísse a banha como
produto fundamental, era aconselhável seguir as seguintes providências:
Introdução de reprodutores do suíno tipo carne, instalações adequadas,
assistência técnica, manejo, nutrição balanceada e respectivo financiamento. Cálculo
permanente dos índices de conversão física e econômica em cada lote. A soma
dessas providências conduziria, por si só, produção igual nos doze meses do
ano, levando à estabilidade nos preços desejada por todos.
Entre
esses frigoríficos, somente dois adotaram as providências acima enumeradas: as
Cooperativas Cosuel e Languiru. As duas cooperativas não tinham capital para
financiar os produtores e convênios com Banco, permitiram financiamentos
rápidos e sem burocracia aos produtores, todos avalizados pelas cooperativas, e
tornava a fiscalização bancária desnecessária.
Era denominado “repasse” e nem era necessário o suinocultor ir ao banco.
Mais tarde, novo frigorífico de capital particular foi criado em Lajeado,
operando desde o início dentro das normas necessárias.
No
restante do RS ocorreu situação idêntica: Dos cinquenta e cinco frigoríficos
existentes na época, restam hoje em atividade apenas dezoito.
Em
nosso entender, na época, os demais frigoríficos já estavam condenados a fechar.
Não tiveram visão administrativa, não acreditaram no futuro que haveria de vir
nem se dispuseram à análise de uma outra estratégia.. Era só uma questão de
tempo. Um a um, lentamente, foram desaparecendo na mesma medida que as duas
cooperativas e outros aumentavam substancialmente a sua capacidade de abate. Frigoríficos que estocaram banha aguardando
a tradicional alta no verão foram rechaçados em seus objetivos. Já ocorria
maior abate nos meses iniciais do ano e nem os frigoríficos que não estocaram
banha permitiriam um aumento abusivo nos preços. O consumo de banha já tivera
redução expressiva.
. Acertados
entre si, três frigoríficos do RS e dois de SC mantiveram o mercado abastecido,
vendendo a banha em pequenos lotes para cada comprador. Como a alta do preço da
banha não ocorreu, os demais se viram obrigados a vendê-la meses mais tarde,
por preço cada vez menor. Prejuízo na certa. Alguns, em decorrência, simplesmente
fecharam as portas.
Os
bancos também já haviam suspeitado que haveria poucos frigoríficos
sobreviventes e controlaram o endividamento dos demais. A falta de crédito
bancário precipitou o desenlace de cada um.
Havia
uma cooperativa Agrícola Mista em distrito do município de Lajeado, que tinha
matriz e duas filiais em região colonial de grande produção de suínos. Vendia
toda a produção a prazo para um frigorífico local que já começava a atrasar os
pagamentos e a cooperativa, já descapitalizada encontrava-se em situação
financeira desesperadora. Decidimos auxiliá-la, atraindo a sua produção, que
elevaria o abate em mais de 50 suínos por dia, subtraindo-os do colega. Seria
também mais um pequeno empurrão ao concorrente em direção ao seu inevitável
fechamento.
Fomos
procurá-los e fizemos a seguinte proposta: Eles continuariam a adquirir os
suínos para pagamento em trinta dias e a Cosuel, que dispunha de capital para
tanto, os pagaria a vista, no ato de entrega dos suínos. O preço e prazo que a
Cosuel pagava era o mesmo para todos, mas nas circunstâncias que a Cooperativa
Agrícola vivia, nada mais era que um gesto de boa vontade. A nossa exigência
era a de fidelidade total e lhe vedava a venda de suínos para frigoríficos
concorrentes. Aceitaram.
Em
duas semanas, já haviam liquidado contas antigas, pagos os impostos e
contribuições sociais atrasadas e sortido suas lojas desfalcadas de
mercadorias. Era outra vida.
O
frigorífico concorrente, já em situação difícil, via diminuir seus abates, sem
que conseguisse adquirir outros suínos nas redondezas. Já perdera o crédito.
Após
alguns meses de penúria, voltaram à Coop Agrícola Mista e fizeram propostas de
preços acima do mercado, prometendo pagar os créditos atrasados e garantindo os
pagamentos em dia, pois um grande financiamento de capital de giro já fora
aprovado no banco. Jamais se concretizou.
Assistimos,
consternados e impotentes, o presidente daquela cooperativa tomar uma medida
imprudente e sem diálogo, da qual se arrependeria pelo resto dos seus dias.
A cooperativa voltou a fornecer suínos, mas o
frigorífico não conseguir cumprir o prometido e a cooperativa ficou em situação
ainda pior do que estava antes. O frigorífico requereu falência, levando a
cooperativa insolvente a entrar em liquidação com evidente prejuízo para seus
associados. Já esperávamos por isso. A diretoria da cooperativa não entendeu
que sua fartura financeira momentânea era totalmente dependente da Cosuel e sem
esta, haveria o caos. Assim foi.
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