terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Crônica - Na terra das águas quentes

NA  TERRA  DAS  ÁGUAS  QUENTES

      Uma vez, no Gravatal e dois cavaleiros andantes estavam postados em uma encruzilhada, cumprindo sua missão de ajudar pessoas desamparadas, crianças perdidas, idosos desprotegidos, vítimas de malfeitores, damas desacompanhadas e libertar virgens raptadas por homens libidinosos. Estavam prontos para o que der e vier.

Não se conheciam anteriormente, mas logo descobriram que tinham algo em comum: Não tinham paciência de acompanhar as respectivas esposas em compras no mercado de roupas do vilarejo. Fizeram contato entre si.

            No bulício da aldeia, tinham visão privilegiada do que se passava nos arredores e estavam atentos para intervir em qualquer momento de perigo, mesmo arriscando as próprias vidas.

            De repente surge, descendo a montanha, uma donzela, nem tão jovem nem tão bela, claudicando fortemente da perna esquerda, e com visíveis sinais de aflição e cansaço. Num pequeno alforje levado a tiracolo, certamente estariam seus documentos e sua pecúnia. Segurava na mão uma enorme sacola com compras. Proporcionou uma cena burlesca e verdadeira.

            Dirigiu-se ao mais jovem dos cavalheiros e clamou por ajuda. Estivera em compras na feira local e perdera o rumo do Hotel Internacional onde se achava hospedada. Seria possível ajudá-la?.

            - Sim, preciosa dama, meu nome é Ataíde. E em largos gestos apontou para a frente e disse: siga pela senda, na direção norte, mais duzentos metros e chegará à portaria da estalagem, no meio de um bosque florido.

            - Tenho ainda outro problema. Onde arranjar uma condução para me levar até o albergue?

            Do outro lado de uma praça circular, estava postada uma graciosa  carruagem cor de  abóbora com faixas amarelas, puxada por um manso cavalo pangaré.  O cocheiro, alertado pelo movimento, e mesmo não ouvindo, entendeu que teria de intervir.  Era a sua primeira oportunidade do dia de ganhar umas moedas para guardar em sua algibeira.

            Com um grito e um vigoroso aceno, foi chamado e trouxe sua carruagem até à beira da calçada.

            Ataíde, galanteador, ofereceu seu braço à dama, para ampará-la no degrau. Ela sentou-se no banco dos passageiros. Agradeceu comovida.

            Ainda mais uma coisa, perguntou. Poderiam me arranjar um marido?

            - De momento estamos em falta de candidato, mas temos boas notícias, minutos atrás, vários mancebos dirigiram-se para a mesma hospedaria e ainda deverão estar por lá.

            Com um sorriso açucarado e um olhar esperançoso, partiu sem olhar para trás.
            Seu nome? Talvez Dulcinéia. Talvez não.

            O outro cavalheiro (eu), omisso até o momento, ainda gritou-lhe: É preciso ter fé. Não mereceu sequer um aceno.

 Lá se foram, levantando poeira, até desaparecerem na primeira curva.

            No dia seguinte, um deles (Ataíde) seguiria para a terra das águas frias, Porto Alegre, onde residia. Encerraria sua vida de cavaleiro andante.

            O outro, ainda permaneceria alguns dias na estalagem Termas Hotel, atuando
sozinho na defesa dos fracos contra os fortes.

            A dama nunca mais foi vista. Deve ter encontrado a felicidade.


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