A
ITAPUCA DE JOÃO
LAMPERT
Foto: Décio João
Bozzetto
Johannes Lampert era o quinto filho de Friedrich
Wilhelm Lampert, jovem imigrante alemão, que chegou ao Brasil junto com a
família de seus pais e irmãos em 1827.
Nasceu em Dois Irmãos em 10 de
fevereiro de 1851 e foi batizado na Igreja evangélica da comunidade, local de
residência de seus pais agricultores.
Em 1875 mudou-se para a localidade de
Brochier, no então município de Montenegro, onde se casou com Maria Ehrig, de
Maratá, localidade vizinha, também em Montenegro e com o prenome de Johann.
Em
Brochier, nasceram três filhos, entre 1878 e 1880 (dois gêmeos)
Mudaram-se
para a Linha Franck, no distrito de Teutônia, então município de Estrela, onde
nasceram mais sete filhos até o ano de 1892.
Os
encontramos mais tarde, participando da igreja evangélica de Conventos,
município de Lajeado, mas residindo do outro lado do rio Forqueta, em Arroio do
Meio. Não encontramos registro de compra de propriedade. Lá nasceram mais duas
filhas, Belarmina (+-1896) e Guilhermina (1898).
Cremos que eram apenas meeiros, o que levou-os
a correr todos os riscos. Era tudo ou
nada e mais uma vez trocaram de residência, cremos que em 1898, e desta vez
para a região de Arvorezinha, nos altos do Planalto Médio, então município de
Soledade. Na região já se encontravam outros interessados que também tinham obtido
o Direito de Posse de áreas devolutas junto à Comissão de Terras do Governo do
Estado, gente de origem luso-brasileira com quem os Lampert mantiveram
convívio. Era o único posseiro de origem
alemã, isso mais de oito anos antes da chegada dos primeiros italianos. Sem
dúvida, já haviam adotado a religião católica. Não seriam os únicos luteranos
da região, o que facilitava o convívio com os católicos. Batizou toda a família
e passou a chamar-se João. Faleceu em 1929 e sua esposa em 1943. Estão
sepultados no cemitério da capela de São Lourenço, nos arredores de Arvorezinha.
Deixaram enorme legado, mais de 300 descendentes e familiares. Um patriarca.
O
que teria levado João e sua família, já com doze filhos, para essa grande
aventura? Seria um visionário, um pioneiro, um maluco ou um desbravador? Ou
apenas mais um herói anônimo que ajudou a formar a pátria gaúcha? Deixara
Teutônia, uma comunidade já formada, com igreja, pastor evangélico, cemitério, escola,
parentes, amigos e transporte fácil de mercadorias pelo rio Taquari, para embrenhar-se
no meio da mata virgem de beleza agreste, mas ainda com animais selvagens e
bugres traiçoeiros, isolados e distantes de tudo e de todos? Viveram com
produtos da caça e coleta de pinhões até que as lavouras iniciassem a produção
agrícola.
Graças
à tradição oral de seus descendentes, sabemos que suas terras se iniciavam
cerca da cidade de Ilópolis e seguiam na direção norte até a gruta nas margens
do rio Guaporé, distante cerca de 10
km . Não identificamos a largura da gleba, mas deve ter
sido no mínimo 1 km
o que já representava mais de 1.000
ha de matas nativas, com araucárias e ervais.
Decidiram
residir no local que mais tarde se chamaria Itapuca (pedra furada), hoje em Anta Gorda , que
pertenceu sucessivamente a Lajeado e posteriormente Encantado, onde foram os
primeiros moradores.
Somente
a partir de 1906, chegaram madeireiros de origem italiana, provenientes de
Caxias do Sul, Bento Gonçalves e Garibaldi em busca da colossal floresta de
araucárias existente no local. Um verdadeiro El Dorado para uma serraria. Mais
tarde, agricultores vindos de Encantado, passaram a adquirir lotes dos posseiros
legalizados e algumas terras devolutas ainda existentes. Logo se tornaram a maioria
da população. Mais tarde, outros colonos de origem alemã também vieram.
A
integração das etnias processou-se com naturalidade (para a sobrevivência,
todos precisavam de todos).
Apesar
da integração inicial, uma geração mais tarde, famílias de origem alemã tiveram
desavenças com as de origem italiana. Consta ter sido por razões de limites de
terras, mas acreditamos que existissem principalmente divergências étnico-religiosas.
A foto acima, por volta
de 1925, sem a nitidez desejável, mostra o momento do ”acordo”, os contendores,
com a mão sobre uma bíblia, juram a paz, mas sem olhar um para o outro e nem
para o livro. Parece sugerir e nos inclina a acreditar, que na verdade pode ter
havido uma imposição por parte do subdelegado de polícia de Ilópolis, o
pioneiro italiano e comerciante Leopoldo Spézia, identificado no meio dos três,
de pé na porta da sua casa de comércio, vestindo um fardamento militar de sua própria
criação. À direita na foto, um colono de origem italiana, vestindo um pala, satisfeito
com a solução. À esquerda, certamente um de origem alemã, vestindo casaco
preto. Ninguém conseguiu identificá-lo. Por dedução, cremos que poderia ser o próprio João Lampert, mesmo com mais de 70
anos. Era o pioneiro e líder. Não haveria acordo sem ele. Aparentemente
contrariado e com a cabeça recuada, parece manifestar repulsa silenciosa à
solução apresentada, tanto que, logo após, todos os colonos de origem alemã
venderam suas propriedades e foram adquirir outras em Arvorezinha, incluindo
entre eles João Lampert e seus familiares, que adquiriram 300 ha . À direita, mais ao
lado, um auxiliar do subdelegado está portando ostensivamente uma espingarda,
argumento definitivo para o acordo.
Pode se comprovar a
influência luso-brasileira no vestuário das testemunhas.
Ainda reside, em
Arvorezinha, uma família remanescente, a de Ernesto Lampert. As demais foram
para Passo Fundo, Jaraguá do Sul – SC, Barracão – PR e outras localidades.
Cremos que essa disputa
entre descendentes de italianos e alemães, que motivou o êxodo dos germânicos,
deve ser a única ocorrida no RS.
Os
filhos de João se casaram com esposos das três origens étnicas e consolidaram
uma nova sociedade. Identificamos: Bôrtolo Girardi, um dos novos proprietários,
que casou com Marcolina Suzana Emília Lampert, filha de João; a filha Oswaldine
casou com Wilhelm Haas e o filho Guilherme casou com Maria de Lima Gomes, descendente
de outro posseiro. Um neto dele, Pedro,
casou com Italina Toigo, bisneta de Antônio Toigo que, juntamente com seu irmão
Ângelo, foram também povoadores iniciais. Os Toigo adquiriram terras de João e
mais tarde, por herança, parte das mesmas terras voltou à propriedade da família
Lampert, cujos descendentes voltaram para Itapuca, hoje município de Anta Gorda.
Era de se esperar que as famílias
pioneiras casassem seus filhos e netos entre si. E assim foi.
Com
o correr do tempo, os de origem italiana tornaram-se a maioria absoluta da
população de Ilópolis e impuseram com naturalidade seus próprios costumes,
prenomes, linguajar, sotaque inconfundível, culinária, cantorias, religiosidade,
vestuário, cultura, comunicação ruidosa, economia, divertimentos e assim
permanece na atualidade. Hoje, Ilópolis se encaminha para sua vocação e destino
turístico, preservando e valorizando suas origens.
LEANDRO LAMPERT
Historiador
Bibliografia:
Monografia ”Itapuca” de Claudete Toigo Lampert
(hoje Gruginskie)
Livros: Ilópolis – Origens e Raízes de André
Bozzetto Júnior e
Os Lampert,
Origens, História e Genealogia de Leandro Lampert
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