A GRANDE BATALHA QUE
NÃO HOUVE
O COMBATE DE TAQUARI
EM 8 DE MARÇO DE 1840
Em
1949 mudei de residência de Lajeado para Bom Retiro do Sul - distrito do
município de Taquari - por motivos profissionais. Morei lá durante 12 anos. Meu
filho primogênito é conterrâneo do David Canabarro, Taquariense nato.
Por
ser sede do município, eu iria pelo menos uma vez por mês à cidade, para
atender afazeres burocráticos. Tive contato e fiz muitas amizades, entre eles com
José Leite da Costa, Engº Agrônomo, filho do advogado Adroaldo Mesquita da
Costa, mais tarde ministro da Justiça do Brasil - e que também morava em Taquari.
Povo
generoso e cordial. Só guardei boas lembranças,
Em Bom Retiro do Sul, envolvi-me em atividades ligadas às tradições gaúchas.
Fui um dos fundadores do CTG Querência da Amizade, em 1957, e seu terceiro
patrão. Misturávamos cultura riograndense e revolução farroupilha. Foi o início
do meu interesse pela história gaúcha e que nunca mais teve fim.
Sabedor
do combate de Taquari, achei no Google a foto do monumento comemorativo e lembrei
que estive há muito tempo no local para conhecer a área dos Caramujos nos
arredores da cidade, o Passo de Taquari, a ilha do Passo Velho. Transpondo o
rio em direção à General Câmara, indaguei ao barqueiro o sítio exato do final a
contenda.
MONUMENTO DO COMBATE
EM TAQUARI (GOOGLE)
Interessado numa relíquia, pedi ao meu amigo
José Leite Costa (o Zé), que tentasse obter uma arma encontrada no rescaldo da
refrega - uma garrucha ou uma ponteira de lança de cruzeta - e me informasse o
preço. Deu em nada.
Em
1962 fui morar e trabalhar em Encantado e, algum tempo depois, o Zé se apresentou
no meu escritório portando um sabre de cavalaria sem bainha, “doado” por um
morador vizinho dos caramujos. Não esquecera a minha encomenda. Logo vi que o
Zé comprara o sabre e não quis cobrá-lo de mim. Era bem típico dos açorianos de
Taquari.
Examinando
o sabre, constatei que a lâmina dele, “Solingen”, era mais grossa e mais pesada
do que as demais que eu tinha também da época farrapa (tinha quase o dobro da
largura). Deveria ser portada por um homem vigoroso. Os copos do sabre já com
folga, demonstraram o tempo de “serviço” da arma e não havia dúvida sobre a sua
antiguidade. Pela fonte e pelo aspecto, admiti a sua legitimidade. Vide foto.
Desejando escrever crônica a respeito da
origem do sabre e do combate de Taquari, procurei nos livros históricos que
herdei do meu pai, nos que eu havia adquirido e também no Google, material
histórico que orientasse a minha crônica. Com surpresa, constatei que quando
mencionado o combate, havia apenas frases esparsas e sem valor real. Tentei
contato com outros historiadores e recebi sempre a mesma resposta. Não tinham
nenhum conhecimento efetivo.
No
Google, vi o nome do historiador taquariense Riograndino da Costa e Silva (primo
do Zé) e passei a procurar seu livro – São José do Taquari. Consegui xerox do
tema que me interessava.
O
livro reproduz crônicas de Othelo Rosa, publicadas no jornal O Taquaryense a
partir da edição de 1° de julho de 1939, que mostrarão o roteiro a ser seguido
em resumo por esta crônica.
Em
Taquari e seus arredores, na zona compreendida entre os arroios Pinheiros e do
Moinho, no ano de 1840 o governo imperial e os republicanos rio-grandenses
mobilizaram os maiores efetivos da guerra que, durante todo o decênio,
estiveram face a face (pág. 193).
Em
números globais: as forças legais, sob o comando do Gal. Manoel Jorge Rodrigues,
7.000 homens; as hostes republicanas comandadas pelo Gal. Bento Gonçalves da
Silva, 6.000 homens.
O
Império e a novel República jogariam, no lance, cartada perigosa e decisiva.
Bento tinha necessidade de resolver logo a parada com os imperiais, que dia
após dia aumentavam em número e armamento suas forças e qualquer demora seria
fatal.
Manoel Jorge não tinha pressa. O correr do
tempo estava ao seu lado.
Bento,
ao lado de David Canabarro, Netto e suas tropas (incluindo Garibaldi, Anita e
seus marinheiros a pé), chegou primeiro e escolheu um local favorável às suas
armas, com um leve declive à sua frente, a existência de um arroio e um mato
fechado que garantia seu flanco esquerdo. Posicionou seus três canhões à frente
da infantaria, a cavalaria na retaguarda (apta a manobrar) e se preparou para
ser atacado pelos imperiais. Manoel Jorge, prudente e acautelado, se posicionou
à pequena distância e, vendo a posição favorável do inimigo, preparou-se também
para ser atacado e ficou aguardando. Sua cavalaria, no momento, não estava em
sua melhor forma.
Bento
vacila (surpreendido pela inércia de Manoel Jorge), não desfere o golpe e adia
o encontro para o dia seguinte. Se sucedem pequenas escaramuças e combates de
cavalaria. A noite cai sem batalha. Ao madrugar do dia, uma cerração densíssima
envolvia Taquari, que só se dissipou às 10 horas da manhã. Foi então que os
farroupilhas, tomados de espanto, verificaram que o inimigo desaparecera. Indescritível
o desespero no acampamento farroupilha. A retaguarda dos imperiais ainda estava
terminando de atravessar o rio.
Bento
manda carregar e ataca os remanescentes entrincheirados na barranca do rio, sendo
que eles estavam sustentados por uma barca a vapor e navios a vela, com seus
canhões direcionados aos atacantes. Novamente surpreendido, Bento, em pequenas
escaramuças reage e, pelo número de mortos de cada lado - 201 Imperiais e 270 farroupilhas
mortos - verifica-se que apenas pequenos grupos se defrontaram. Número
irrisório ante a possibilidade evidente de uma carnificina num corpo a corpo
generalizado.
Manoel
Jorge, recuando, preservou seu exército de um possível desastre. O desgosto
entre os chefes farroupilhas iria prejudicar-lhes grandemente a unidade de ação.
Bento, como comandante indeciso, foi responsabilizado e criticado asperamente.
Bento
Gonçalves da Silva perdeu a última oportunidade de um confronto “tudo ou nada”.
Jamais se repetiria.
Bento
recuou com seu exército para o sítio de Porto Alegre. Canabarro e Netto dirigiram-se para suas
regiões na campanha.
A
revolução seguiu seu curso natural e até a paz surgir, ceifaria a vida de
muitos combatentes.
Tentativas
de paz foram realizadas, mas havia um ponto inegociável pelos dois lados. Os
farrapos queriam um acordo entre dois países e o império considerava os
farrapos como revolucionários dentro do estado do Rio Grande do Sul. Não seria
um país. Não tinha uma constituição, fronteiras definidas e aceitas pelos
vizinhos, não era reconhecido pelos demais países, não enviara embaixadores nem
os recebera, não convocara eleições entre a população.
Somente
em 1845 os farrapos (de má vontade) aceitaram que seriam todos anistiados.
Convocaram 27 oficiais do exército farrapo que, de comum acordo entre eles,
aceitariam a paz com os imperiais condicionando que o Império atendesse uma
série de condições entre elas a libertação dos escravos que lutaram ao lado dos
farrapos. O Império simplesmente ignorou essa cláusula e nenhum farrapo reclamou.
Podiam tê-lo feito, mas não libertaram nem seus próprios escravos companheiros
de luta.
A
paz foi selada verbalmente e documentada em 28 de fevereiro de 1845 por declarações formais dos líderes farrapos David
Canabarro e Lucas de Oliveira, em nome de José Gomes Vasconcellos Jardim. Consideraram
a luta terminada e em 1º de março, por proclamação do Barão de Caxias
aos seus comandados, informando que os revoltosos já haviam deposto as armas,
aceitaram a anistia e estavam novamente congraçados como súditos de S. M. I. Dom
Pedro II.
Caxias
determinou que os Farrapos que se dirigissem ao Ponche Verde para entrega dos
escravos e dos armamentos. Netto inclusive.
Um
obelisco em Ponche Verde comemora que naquele local a paz foi assegurada.
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