MIL PARES DE BOTAS DE
NAILON
Transcorria o ano de 1967, eu
trabalhava na Cooperativa dos Suinocultores de Encantado Ltda. e estava a
serviço em São Paulo. Tinha uma hora de folga e resolvi visitar a sede de uma
empresa congênere, um matadouro de suínos, expoente em Santa Catarina e que
estava próxima.
Apresentei meu cartão e disse que
desejava falar com um Diretor. A secretária perguntou qual o assunto e eu falei
que era apenas uma visita social. Desejava me apresentar e conhecê-lo, hábito
normal meu.
Recebido, ele disse-me que já me
conhecida de nome e falamos sobre o mercado de carnes de suíno.
No decorrer da conversa, vi que
sobre a sua mesa havia uma bota preta.
- Com licença. Que bota é essa?
Peguei-a e examinei-a. Gostei.
- É uma novidade, adquirimos um lote
para testar na “zona suja” de um dos nossos matadouros. Vamos subsidiar a metade
do custo aos operários.
Minutos depois, agradeci e
retirei-me.
Chegando a Encantado, determinei ao
gerente do supermercado-loja, que verificasse o estoque de botas de borracha,
baixasse o preço ao custo, porque em breve viria um vendedor de botas de
náilon. As de borracha, logo ficavam estragadas pelo contato com sangue, sal,
água quente e soda barrilha usados na limpeza do ambiente.
Instrui-o para que quando chegasse o
vendedor e juntamente com o seu encarregado de compras verificasse a qualidade
e “pensando grande” se pronunciasse depois comigo, para ver quantos pares
compraríamos. Eu estaria presente no fechamento da operação.
Dias depois, juntamente com o
vendedor e trazendo uma bota de cano médio na mão, entraram em meu escritório.
- Aprovamos a bota e pelos preços,
deveríamos comprar 500 pares, mas é muita bota e optamos por comprar 200, a
tabela logo superior.
Mostrou-me a tabela: Preços para 10,
20, 50, 100, 200 e 500 pares. Para cada quantidade, um preço mais baixo e para
500 pares, preço significativamente menor. Logo vi que a fábrica estava
forçando venda de lotes grandes em seu lançamento e tinha confiança na
qualidade do produto.
Tive dois minutos para raciocinar e,
em pensamento, assumi o lugar do fabricante: Aceitaria uma contraproposta,
desde que a quantidade fosse maior.
- Qual é o preço para mil pares ? (o nosso
gerente empalideceu)
- Tenho que falar com o meu chefe em
S. Paulo.
- Pode ser agora ?
– Pode.
- Nossa oferta para mil pares, é um
desconto de mais 5% no preço e aceitamos o prazo de 30 dias. O envio imediato
será de 500 pares e quando tivermos pago a duplicata, remeterão os outros 500.
Não há risco maior.
Foi feita a ligação na nossa presença,
logo aceita pelo fabricante. Negócio fechado.
Meu raciocínio: Tínhamos 500
funcionários e mais de 300 deles trabalhavam em áreas insalubres. A cooperativa
tinha 24 supermercados-loja em diferentes municípios e mais de 1.800
associados. Um produto necessário, bom e barato teria rápido escoamento,
beneficiando a cooperativa, associados e empregados.
O custo de um par de botas do lote de
500 unidades ficava um terço menor do que um do lote de 10.
A olho, calculei de cabeça que o preço
de fornecimento seria cerca do preço de aquisição de 10 pares diretos da
fábrica. Ficou alguns centavos menos.
Ao gerente da loja sede, falei.
Escolha os números dos tamanhos e somente compre botas para adultos. Se tiver
medo de assinar o pedido, traga-o aqui que eu assino.
Eu acabara de realizar uma jogada de
marketing com muita ousadia e que daria muito que falar. Acertei em cheio.
Comentários: Desta vez o homem ficou
louco mesmo.
Dias depois, o gerente me informou:
Repetimos a jogada das botas e compramos 500 guarda-chuvas e sombrinhas. Tinha
aprendido a lição.
Mais uns dias, e parafrazeando citação
popular, quebraram-se os cântaros do céu e a água derramou-se sobre a terra.
Choveu durante quarenta dias e quarenta noites.
O consumo de botas e guarda-chuvas
atingiu volumes inesperados. Três meses depois, adquirimos mais 200 pares de
botas e 100 guarda-chuvas.
Quem não arrisca, não petisca.
Dois meses depois, fomos a uma reunião
do Sindicato da Indústria de Produtos Suínos do RS e todos os demais colegas
tinham visto cópia do nosso pedido e também adquiriram as mesmas botas. Fizeram
gozação comigo.
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