quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

CLUBE  TIRO  E  CAÇA  –  SUA HISTÓRIA


            O Tiro de Guerra 236, sociedade civil com estatutos registrados em Cartório, foi fundada em 20 de agosto de 1916, era proprietária de sobrado sito na Rua Santos Filho, 275 em Lajeado.  Cumpriu seus objetivos até 1945, quando os cursos de ensino militar particulares foram encerrados no Brasil.

Restou um patrimônio imobiliário, gravado com um contrato de comodato com o Ministério da Guerra, só extinguível com o encerramento das atividades da Sociedade e liquidação do patrimônio que, por imposição estatutária, seria doado às entidades assistenciais de Lajeado. O imóvel também achava-se hipotecado junto à Cooperativa Banco Popular de Lajeado (Caixa Rural), gerenciada por Jacob Scheid Sobr., em garantia de empréstimo para adquirir a sede na cidade. Estava com seus compromissos financeiros em dia e restava ainda um saldo a pagar para liberar a hipoteca.

Surgiu a ideia de, aproveitando a existência de razoável patrimônio líquido, criar um novo clube com a venda do acervo, com outros objetivos sociais, bem como pagar a Caixa Rural e investir numa área com bosque na periferia da cidade, criando um clube campestre. Logo evoluiu para um Clube de Caçadores, existentes em todo o mundo desde a idade média.

Em Lajeado, pelo menos um terço dos homens adultos caçava a fauna nativa, durante todo o ano, sem distinção de espécie. Não havia limites e poucos tinham registros de armas e licenças de caça. Não havia fiscalização.

Alem da caça desenfreada, o desmatamento e mais tarde o uso de inseticidas na lavoura, estava levando a fauna à extinção.

O novel clube colaboraria com a Federação dos Clubes de Caçadores do RS na divulgação de regulamento indicando espécies, quantidade, épocas e rotatividade de áreas rurais e proibindo a caça de espécies que estavam em risco de extinção. Pela primeira vez, parte da população estava compreendendo o que era ecologia e defesa do meio-ambiente. Os próprios associados fariam respeitar as normas.

Tudo parecia fácil, mas as dificuldades logo se apresentaram. Primeiramente, o Ministério da Guerra recusou-se a liberar o contrato de comodato que garantia a disponibilidade de residência para o sargento instrutor, sala de aula, depósito de munições e local para o armamento. Aceitava a mudança do objetivo, mas exigia que no novo nome da sociedade – que sucederia o Tiro de Guerra – tivesse a palavra TIRO, deixando evidente a dependência com o Exército. Em lugar de Clube dos Caçadores e por decorrência da palavra Tiro, a diretoria da nova sociedade teve que mudar o nome pretendido para Clube Tiro e Caça, que não agradou a ninguém. Exigia que o novo imóvel assumisse o contrato de comodato, em vigor até hoje e uma entidade que avalizasse esse compromisso. O prefeito nomeado Ruy Azambuja (procurado por Mário Lampert e um Coronel do exército devidamente credenciado), no mesmo ato, editou documentos que a Prefeitura Municipal de Lajeado assumiria, se fosse exigida, essa responsabilidade.

Restou a opção: Transigir com Clube Tiro e Caça ou nada. Deu Clube Tiro e Caça. Um nome não faz um clube e sim um clube faz um nome.

Formalmente a diretoria do Clube Tiro e Caça tratou de vender a sede do antigo Tiro de Guerra 236, adquirir na periferia da cidade uma área rural com mata nativa e resgatar a hipoteca na Caixa Rural. Da terra adquirida, seria reservada uma área (menos da metade), de frente para o rio Taquari, destinada a um loteamento cuja receita cobriria as deficiências financeiras da compra da área rural e os futuros gastos com o cercamento da propriedade, terraplenagem, iluminação, água e construção da pedana de tiro ao prato, sede social, aquisição de um aparelho de lançamento dos pratos alvos e máquina manual de fabricação de pratos, aproveitando os cacos dos pratos acertados pelos atiradores, mão de obra etc. O bosque restante seria preservado.

A área destinada ao loteamento era localizada em duas quadras paralelas, abrangendo três quarteirões grandes e dois pequenos. Provavelmente de 60 a 70 terrenos, entre as ruas 26 de janeiro e 17 de dezembro, em todo o comprimento da compra. Os terrenos demarcados e anteriormente desmatados foram vendidos à vista diretamente pela diretoria e sem intermediários. Norberto Zart coordenou a venda dos lotes. Em Lajeado e naquele local, os terrenos valiam pouco. O bairro chamava-se por razões óbvias, Neggerberg (Morro dos Negros) e perto de uma casa de baixo meretrício denominada “Martelo”. Não havia ruas, nem água e nem luz.Tinha dificuldade de acesso nas enchentes. Era região de má fama.

Um dia, perguntei ao meu pai – Como vai o loteamento?. – Todos os terrenos estão vendidos, menos um que ninguém quis comprar por ser maior, mais caro e ter as quatro faces com metragem diferentes. Fui ver o terreno e o comprei. Muitos anos depois, após considerar que eu jamais voltaria a residir em Lajeado, vendi o terreno para Sérgio Roberto Jaeschke Jaeger. Cito esses detalhes para que hoje se localize até onde ia o loteamento (vide mapa ao final).

No período em que Mário Lampert era prefeito municipal, foi construída e inaugurada a caixa d água da Corsan, dando fim ao tormento dos poucos moradores locais e valorizando o bairro que se chamaria Hidráulica. A partir daí, a área se desenvolveu.

Lembro de um fato curioso. Tornou-se necessária a derrubada de cerca de quinze árvores para a construção da estrada de acesso à sede social e da pedana. Num domingo e no início das obras, nos deparamos com quinze covas no chão, destinadas ao plantio de quinze essências vegetais comuns na região. As mudas estavam dentro de latas de compotas vazias cujos fundos haviam sido retirados. Meu pai convidou cerca de dez presentes para apadrinharem o plantio das mudas que compensariam as árvores derrubadas.

Tomou uma pá e soterrou a primeira muda de cerca de 70 cm de altura, com lata e tudo, sob palmas, emoção e muitas risadas. Passou a pá para Mário Jaeger plantar a sua, que a repassou para Norberto Zart, Carlos Pereira Marques, Diamantino Cerutti e os demais. Fui o último a plantar a “minha” árvore e as restantes todos ajudaram. Não sei se ainda poderia localizá-la.

Assim Lajeado recebeu de presente – e graças a um pequeno número de associados, um amplo clube que hoje (70 anos após sucessivas e competentes diretorias) alcançou o estágio atual e que conta com um patrimônio físico, cultural e social que ostenta com orgulho. Um Clube novo, sem custo e sem dívidas. Uma façanha. Um pugilo de abnegados e uma meta definida. Liderança, planejamento e execução. Creio que o Clube teria no máximo duzentos associados.

Após os primeiros vinte anos dedicados exclusivamente ao seu quadro de atiradores e amantes da natureza, realizando treinamentos e torneios de tiro ao prato em diversas solenidades anuais (eu fui o vencedor num concurso anual de tiro ao prato, denominado Rui Lopes, com direito a taça. Dante Moraes foi o vice).

Encarecimento da munição, da licença anual de caça e porte de arma de fogo, redução da fauna e custo de deslocamento fez diminuir o número de associados e a própria diretoria, sendo Mário Lampert o presidente, entendeu que deveria aceder aos apelos da população ainda não associada e diversificasse as atividades de CTC, criando quadras de tênis e outros esportes, assim como piscinas de recreação. Outras atividades sociais e culturais que agregassem número maior de associados, especialmente a juventude.

Mário Lampert, muitas vezes reeleito presidente, entendeu que seu tempo já havia passado e uma diretoria completamente renovada e com outras lideranças traria o sucesso almejado. Assim foi e assim será. Hoje, o CTC é referência positiva como clube social.

Eu, filho e neto de ex-presidentes do Tiro de Guerra, filho do primeiro presidente do CTC e hoje verificando que eu sou o único ainda vivo entre os vinte que assinaram a ata de fundação em 1946 e que participou ativamente na estruturação do Clube, desejo com este depoimento, legar à diretoria e associados a minha visão sobre o nascimento e vida do CTC, sucedendo o Tiro de Guerra criado há um século.  

Almejo à atual e cada nova diretoria sucessos sem precedentes e registro o meu orgulho em ter participado do nascimento do Clube Tiro e Caça.













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