quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

GARIBALDI

            Garibaldi, navegador e teórico da república, foi condenado à morte pela corte Genovesa, então parte do reino da Sardenha e Piemonte, cujo rei era Carlos Alberto de Savóia. Dessa forma, teve que evadir-se de sua Itália por participar da fracassada insurreição contra o sistema de governo monárquico existente. Na época, o rei era a última instância do condenado a ser executado. Poderia solicitar o perdão ou a transformação da pena capital em prisão.
      Foi para a França e foi novamente perseguido. Fugiu para a Tunísia e depois para o Rio de Janeiro.
           Com assistência da maçonaria teve uma entrevista com Bento Gonçalves, autoridade militar da República Rio-Grandense e prisioneiro em fortaleza Imperial no Rio de Janeiro.  Afinados, acertaram que lhe seria outorgada pela república uma Carta de Corso, que o habilitaria a atacar e apreender navios de guerra ou de comércio com bandeira do Império juntamente com suas cargas, em troca da metade do butim.  Em seu pequeno barco, tremularia pela primeira vez nos mares o pavilhão tricolor farrapo. A Carta de Corso mencionava que o barco deslocava 120 toneladas.
            A novel república lhe facilitaria o acesso aos portos marítimos que dispusesse, assim como os dos “países amigos” para reabastecimento.
               Em poucos dias, Garibaldi conseguiu tripulação (a maioria de italianos expatriados como ele) e um pequeno barco de cabotagem, que deslocava 20 toneladas – denominado de Mazzini. Armou um pequeno canhão no convés, escondido entre mercadorias, e aproou ao  oceano em  busca  de presas. Junto com elas, também alcançou a imortalidade.
    Em mar aberto, sob ameaça, abordou o navio de carga Luiza e tomou-o.  Renomeou o barco apreendido como  Farroupilha. Trasladou-se para o novo barco e desfraldou a bandeira farrapa. Após, afundou o Mazzini.  Como corsário honrado, não tocou nos tripulantes, passageiros e  seus    bens pessoais. Mais ao sul, deixou-os em terra firme sãos e salvos.
              Após tentar vender o produto do primeiro saque em Maldonado – 54 toneladas de café em grão –, foi perseguido pela marinha uruguaia.  Entrando em águas argentinas, foi atacado, sendo ferido no pescoço. Foi preso e teve o seu barco  confiscado, bem como o produto do saque apreendido.  Esteve em relativa liberdade pessoal em uma pequena vila, onde restabeleceu-se.  Na segunda tentativa de fuga a cavalo, via Uruguai, chegou a Piratini, onde se apresentou para lutar pela república.
            Na Argentina, aprendeu a cavalgar. Guerrear, aprendeu com os farrapos.  Construiu em Camaquã dois barcos (o Seival e o Rio Pardo) e praticou atividades de corso nas águas interiores do RS. Ajustou com a república que o resultado do saque aos navios de comércio do Império brasileiro seria divididos em três partes iguais, cabendo uma delas a ele próprio. Mais tarde, cercado no rio Capivarí, conduziu os navios por terra até o mar em Tramandaí. Porém, apenas o Seival chegou a Laguna, onde participou da tomada da cidade. O Rio Pardo naufragara em águas de Santa Catarina. Como corsário, reiniciou com sucesso a prática de saques de navios cargueiros do Império, contando com uma esquadrilha de três barcos que atuavam em conjunto: O Rio Pardo, navio capitânea (ex Itaparica), comandado por Garibaldi, o Seival e o Caçapava.  Lá conheceu e enamorou-se por Anita que seria sua valorosa companheira.
          Meses depois, derrotado junto com os farrapos em Laguna e após o colapso da República Juliana, perdeu todos os barcos e o butim obtido com as atividades de corso que praticou nas imediações do porto de Laguna, retirando-se por terra para o sul.
           Acossado em Curitibanos, teve que aceitar o combate e deixou Anita, juntamente com alguns soldados, em guarda da munição. Derrotado, fugiu para o RS, deixando Anita prisioneira do Império. Anita evadiu-se sozinha e foi ao encontro de Garibaldi. Já grávida, encontrou-o dias após em Vacaria.
          Ao se dirigirem para o sul, os Farrapos encontraram oposição armada na vila do Imarui. Canabarro, irritado, determinou a Garibaldi que tomasse a vila pelas armas e autorizasse o saque das moradias. Não encontraram riqueza e sim muita bebida alcoólica. Desvairados, praticaram estupros, roubo de objetos, violências.  Garibaldi menciona o fato em suas memórias. Este ato foi o seu único arrependimento no Brasil.
            Acompanharam o exército farrapo em retirada até Viamão, onde ficaram “abrigados”, certamente em casa alheia.
            Mais tarde, com a gravidez de sete meses e sem lar, Anita acompanhou os mil farrapos na aventura fracassada de tomar o porto de São José do Norte.
             Nos arredores de Mostardas, foi abrigada em rancho de pescadores – família Costa –, aguardando o parto.  Garibaldi seguiu para a batalha.  Derrotado outra vez em 15 de julho, fugiu novamente. Poucos dias antes de nascer seu filho, foi ao encontro de Anita. Nascido o filho Menotti em 16 de setembro de 1840, constatou que não havia roupas adequadas para a criança nascida em inverno rigoroso. Dirigiu-se a cavalo à Viamão, onde conseguiu auxílio de outro italiano para comprar as roupas. Retornando a Mostardas, não encontrou mais a mulher e a criança, que por temor dos Imperiais, fugira com seu filho para os matos, onde Garibaldi os encontrou.
           Os Farrapos determinaram que o casal fosse mais uma vez abrigado em casa abandonada, à beira da Lagoa dos Patos, junto a foz do rio Capivari.
           Garibaldi, Anita e o filho, no começo de 1841, acompanharam a retirada dos exércitos farrapos de Setembrina (Viamão), subindo a serra até Vacaria, com atrozes sofrimentos, frio e fome. Dali para Passo Fundo, Cruz Alta e finalmente São Gabriel. Participaram de batalhas como vencidos e vencedores, sem que houvesse qualquer resultado definitivo. Em suas memórias, a nomeia de “ritirata disastrosa”.
           Garibaldi compreendeu que a revolução não tinha mais futuro de vitória e sucesso pela inexistência de um porto marítimo.  A paz tinha só um impasse. Os farrapos queriam um acordo entre países e o Império oferecia anistia geral aos insurretos. A República Rio-Grandense jamais foi reconhecida como país por qualquer outra nação. Nem pelo Uruguai. Quatro anos após, a anistia finalmente foi aceita a contragosto, com o custo de centenas de vidas perdidas inutilmente em batalhas que não levaram a nada. Um arremedo de acordo de paz em Ponho Verde, foi e ainda hoje é veiculado como sendo verdadeiro. O Império jamais assinou qualquer acordo com os Farrapos.
          Em março de 1841, com aprovação de Bento Gonçalves e na maior miséria, decidiram ir de São Gabriel para o Uruguai, donde mais tarde iriam para a Itália. Garibaldi recebeu pelos serviços que prestara à república 900 bovinos como pagamento. Mau tropeiro, chegou a Montevidéu só em junho, com cerca de 300 esquálidas cabeças de gado que foram vendidas para pagar o custo dos tropeiros contratados e os primeiros gastos em Montevidéu. Havia pedido anistia, prometendo não mais combater contra o Império.  Foi-lhe concedida.
           Poucos anos antes de partirem do Uruguai para a Itália, Anita, com mais filhos, já casada anteriormente em SC, ao acreditar no falecimento do seu primeiro marido contraiu um segundo casamento com Garibaldi.
             Pesquisadores nunca encontraram a sepultura do seu ex-marido.
          Anita apresentou-se na igreja como solteira e analfabeta (mesmo que trocasse cartas com Garibaldi), e por isso não assinou a documentação. O casamento foi em dia impróprio – Sábado de Aleluia – e não foi realizado pelo pároco e sim por um padre alheio àquela igreja. Foram dispensados os proclamas e Garibaldi deu um relógio de ouro ao padre oficiante. A mãe de Garibaldi jamais aceitou esse casamento como válido, sendo por isso motivo de contínuas desavenças entre elas.
           Durante certo período 17 de junho de 1841 até 15 de abril de 1848 –  combateu no empobrecido Uruguai ao lado do presidente José Fructuoso Rivera, que lhe atribuiu o comando da pequena esquadra de três navios de guerra em lutas internas e contra o ditador argentino Rosas. Derrotado em combate, mais uma vez, mandou incendiar a frotilha. No Uruguai, como mercenário mal pago, foi sempre um enteado da sorte. Viveu em extrema dificuldades financeiras, suportadas com coragem por Anita. Em 27 de dezembro de 1847, mandou a esposa e filhos para a Itália e logo seguiu-os. Lá, em outra fuga continuada após mais derrotas e fugas na Itália, Anita (grávida novamente) encontrou a morte sem qualquer assistência. Garibaldi, acuado, reiniciou a fuga e solicitou a terceiros que sepultassem Anita. Com medo dos austríacos que proibiam qualquer auxilio aos rebeldes, o fizeram em surdina em cova rasa, clandestina, num monturo e com medo de peste, arrastaram-na com uma corda pelo pescoço. Cinco dias após, apareceu o braço da Anita. Avisada a polícia austríaca, o legista, em razão de marcas de corda no pescoço e traqueia rompida, atestou, erradamente, morte de Anita por enforcamento e denunciou Garibaldi como assassino. O falecimento natural de Anita foi, na verdade, assistido por várias pessoas. Com o atestado de óbito, foi levada em uma carroça e sepultada num pequeno cemitério. Somente dez anos depois, seus despojos foram trasladados para uma sepultura condigna.
             A História dignificou-a como figura exemplar, estoica, esposa, mãe e guerreira. Hoje existe em Laguna museu e estátua em sua homenagem. Seus valores servirão de modelo pois, mesmo não tendo nascida gaúcha, é orgulho nosso.
           Em suas memórias, Garibaldi faz mínimas referências à Anita e aos farrapos. Lamentou não dispor na Itália de cavalaria igual à dos exércitos farrapos.
               Há mais em outras fontes: O padre em exercício da vice-presidência da República Juliana, em Laguna, entrou sem avisar na sala do general e deparou-se com Canabarro, de calças arriadas, mantendo relação sexual com uma lagunense encostada em sua escrivaninha. Saiu aos gritos de “vi o demônio”. Lá se finalizou a ruptura entre os Farrapos e a República Juliana.
             Após a retirada dos Farrapos, o padre foi encontrado nas ruas de Laguna, morto, nu e castrado.
         Tempos depois, em nova situação política na Itália, Garibaldi foi o herói que congregou todas as forças e levou à unificação do seu país.  Apesar de ser um antimonarquista declarado e ativo, Garibaldi acabou encontrando a glória ao contribuir para a unificação da Itália sob a monarquia de Vitor Emanuel II, filho de Carlos Alberto, soberano da Sardenha que abrangia Gênova – e cuja corte condenara Garibaldi à morte em 1834, mais de vinte anos antes, por atividades violentas contra a monarquia. Quem diria.
             Carlos Alberto de Savóia era rei da Sardenha e Piemonte em 1832 e pai de Vitor Emanuel II, rei da Sardenha e Itália unificada, de 23-3-1849 a 17-3-1861. Lutou para que o filho do rei que o condenara a morte fosse o rei que unificaria a Itália.
            Terminada a luta, Garibaldi recebeu do rei, como compensação de sua participação nos combates, a propriedade de toda a ilha de Caprera, onde bem mais tarde faleceu.
             Esta é a vida de um controverso aventureiro, mercenário, soldado da fortuna, que nunca lutou sem vantagem econômica.
      Os povos necessitam ter heróis para reverenciar.
                 
Bibliografia: Entre outros, livros: História de Santa Catarina, do lagunense Oswaldo R. Cabral – Editora Laudes (vide Google),  Anita Garibaldi, de Paulo Markun – Editora SENAC – São Paulo.- ZH de 7-9-2011 pg 29, Dicionário Farroupilha – Garibaldi e a Guerra dos Farrapos, de Lindolfo Collor. – Vitor Emanuel II da Itália de Marcos Júnior (Wikipédia - Google) – Expedição dos Mil (Wikipédia)


A seguir, biografia de Vitor Emanuel II e relato da “Expedição dos Mil”, encontrado Wikipédia no Google.

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