OS FARRAPOS
LEANDRO LAMPERT
HISTORIADOR
Abril
2019
S U M Á R I O
OS FARRAPOS
Preâmbulo ……………………………… 4
O cenário ……………………………….. 4
A Revolução Farroupilha
…………….... 8
Garibaldi …………………………………
12
Vitor Emanuel II
………………………… 16
A expedição dos mil ……………………
17
A retomada de Porto
Alegre ………….. 20
Imigrantes em trânsito
…………...……. 22
Ata dos Farrapos
…………………...….. 24
Luta e Paz
…………………………...….. 26
Migrantes para Santa Maria ………….. 27
Omissões ……………………………..…
28
A grande batalha que não
houve ……. 30
Pátria
e Querência …………………..…. 33
PREÂMBULO
Desde menino, as histórias das
revoluções do RS foram objeto de minha atenção e curiosidade, ouvindo meu avô
Leopoldo, proprietário de um haras de criação de cavalos puro sangue inglês em
Itaipava dos Ramos, no interior do município de Lajeado e seus dois irmãos. Os
três com um casal de filhos (os homens sempre presentes) e mais um vizinho,
Tte. do exército Heitor Alves de Oliveira, no chimarrão em nossa casa todas as
tardes. O tema, sempre os cavalos, as revoluções do RS e mais tarde a II grande
guerra na Europa.
Meu avô e dois dos seus irmãos (um
era maragato) participaram ativamente da revolução de 1893 e meu pai e seu
vizinho Tte. Heitor, da fracassada revolução de 1932, quando parte mínima dos
gaúchos se incorporou aos paulistas e foi derrotada por Flores da Cunha.
Nunca comentada, por desconhecida, a
participação de dois Lampert, Klemens (1845) e seu primo-irmão Karl (1846) na
guerra do Paraguai. O primeiro foi ferido (ou desertou) e voltou a Dois irmãos,
pois teve um filho antes do término da guerra. O segundo foi morto nas batalhas
de Curuzu em 1º de agosto de 1866.
Havia, ainda, um vago rumor que um
Lampert participara da Revolução Farroupilha – um farrapo, seria óbvio.
Somente meio século após, com amarga decepção
(logo superada), encontrei elementos que permitiram conhecer a participação de
Michael Lampert (26-12-1817), emigrado com sua família, engajado como soldado
voluntário na cavalaria do exército imperial em 7 de maio de 1838. Lutou por
três anos durante a Revolução Farroupilha. No livro, conto a sua história.
Nossos antepassados foram o que foram.
Sabiam o que estavam fazendo. Não nos cabe julgá-los.
Farei o relato de “Os Farrapos” sob
o ponto de vista provável do Michael
O CENÁRIO
O RIO GRANDE DO SUL
O
RS foi colonizado muito depois dos demais estados brasileiros. Um século antes
da chegada dos alemães (1725) os lagunenses começaram a desbravar o deserto
verde que ia de Torres até a Colônia do Sacramento e se mantiveram somente nas
áreas próximas ao litoral do Atlântico.
Anos mais tarde, casais açoritas foram trazidos pelo governo português
para povoar as terras da margem direita do rio Guaíba e da Lagoa dos Patos,
para se ocupar dos afazeres da lavoura a que estavam habituados na vida
insular. Começou então a saga que nunca mais teria fim: os problemas na
distribuição das famílias nos lotes prometidos. A região da campanha não os
queria e depois de muitas protelações, foram assentados em Viamão e parte dali
transferidos para Triunfo, Taquarí, Santo Amaro, Santo Antônio da Patrulha, Rio
Pardo e outras regiões. Estes açorianos imprimiram e mantiveram até hoje as características que distinguem
estas cidades das demais do estado.
Incompetência, má administração e
corrupção nos órgãos públicos responsáveis, marcaram o início da destinação
oficial das propriedades rurais, males
que para sempre se mantiveram
presentes e hoje mais do que nunca.
Quase todas as terras devolutas do
estado já estavam invadidas pelos militares que participaram das lutas platinas
e seus familiares, executando por conta própria o povoamento das terras,
incluindo as até então chamadas “campos neutrales”. O governo acabou por sancionar como doações
de sesmaria as terras que já estavam ocupadas, apenas legalizando fato
consumado, já que o objetivo inicial havia sido alcançado: o povoamento da
região meridional pelos lusitanos, efetivando a posse definitiva da região para
a coroa portuguesa.
Cada estancieiro era um guerreiro
sempre pronto, juntamente com sua família, empregados e escravos, para ser
recrutado gratuitamente pelo governo. Se apresentavam munidos de armas, os
cavalos encilhados para transporte e se alimentavam de carne do gado abundante
na região. Era um exército sem custos, aguerrido e conhecedor da região. Nas
guerrilhas, era imbatível.
A geografia do pampa com suas pastagens nativas abundantes, quase
infinitas e gado alçado vagando, milhões de cabeças, sem dono pelos campos,
depressa inclinou os povoadores para a pecuária extensiva, permanecendo apenas
a agricultura de subsistência, não atingindo um dos objetivos iniciais do
governo, o de fornecimento de gêneros alimentícios agrícolas para o exército
regular e para os povoadores das cidades que já começavam a despontar,
Graças aos lagunenses e a estes militares-estancieiros que ocuparam as
terras de campo aberto (até então sem lei nem rei) juntamente com o
exército português existente no sul,
nossas fronteiras meridionais foram alargadas e fixadas à ferro e fogo, durante
um século, em lutas quase contínuas com os castelhanos.
Estava pronto o cenário para o
início da grande epopeia da imigração em massa de povos centro-europeus, de línguas
e costumes completamente diferentes dos até então existentes no RS, sob a
supervisão governamental. Sua influência e alcance jamais poderão ser medidos,
nem as aventuras, padecimentos e sucessos dos imigrantes narrados em livros e
mostrados em filmes editados com o vigor realístico que os demonstre, revelando
ao gaúcho atual sua enorme dimensão e influência nos destinos do nosso estado.
Hoje, cerca de quarenta por cento da nossa atual população é consequência dessa
resolução de Dom Pedro I e seu filho D. Pedro II.
Depois da Independência, D. Pedro I,
vendo que as terras de mato não eram ocupadas pelos estancieiros gaúchos,
procurou e achou nova fonte de povoadores nos habitantes de língua germânica
que viviam em condições difíceis em suas terras europeias e recém saídos de
anos de conflitos armados. Não vieram como pedintes ou foragidos, mas atendendo
insistente convite do governo brasileiro, que credenciou e contratou o major
Schaeffer, para recrutar os agricultores a emigrar para o Brasil, encontrar o
sonho de felicidade e terra própria.
Promessas mirabolantes não faltaram.
A escolha da região para a
colonização não encontrou impedimento por parte dos estancieiros, pois não
provocava concorrência na posse da terra nem no ramo de atividade. Até pelo
contrário, a existência de glebas de floresta sem dono, para colonização,
permitiria que os intrusos e posseiros (ilícito já então existente no meio
rural) encontrassem locais para assentamento, reduzindo a pressão sobre os
ruralistas.
A chegada de imigrantes de origem
alemã não provocou discriminação racial contra os novos povoadores. Não havia
sequer contato recíproco. Mais tarde, a discriminação passou a ser social e
econômica. Esta, com o progresso material e cultural dos imigrantes, o tempo se
encarregaria de minorar e extinguir.
O trabalho braçal na lavoura ou
artesanato, dali em diante, perderia o conceito de vergonhoso, até então
existente na mentalidade do povo. Trabalho duro era para negro escravo.
Durante 50 anos, a partir de 1824,
com a interrupção de 10 anos no período da
Revolução Farroupilha, milhares de colonizadores atenderam ao chamamento
e vieram participar com seu concurso
obstinado no desbravamento da nova terra. Depois da guerra dos farrapos,
também iniciou-se a colonização patrocinada pela província do RS e igualmente,
por agentes particulares, que compravam, loteavam, vendiam e financiavam as
terras para os novos colonos, introduzindo a prática curiosa de separação dos
assentamentos de acordo com a religião dos compradores. Havia óbvias razões
econômicas. Bastava uma única igreja, escola, cemitério, etc. Era a reforma
agrária privatizada. Teve total sucesso
e deixava o agricultor liberto da orientação burocrática do governo. Passado o
período desbravador no vale do rio dos Sinos, toda a colonização das áreas
excluídas dos povoamentos iniciais, foi feita somente pela iniciativa privada
durante o século seguinte. O tempo mostrou que agricultores subsidiados
reduziam-se à economia de sobrevivência quando cessava a ajuda do governo.
Ainda hoje é assim.
Cinquenta anos após a chegada dos
alemães iniciou-se a colonização italiana, que também durou quase 50 anos.
Estes bravos italianos que emigraram pelos mesmos motivos dos alemães, foram
jogados na agreste região serrana sem a menor assistência ou estradas de
acesso. Mesmo assim, sobreviveram e progrediram. Encontramos cópia de propaganda
de convencimento dos italianos para emigrar para o Brasil. Dizia “Brasile, il
paese della cuccagna” (Brasil, o país da fartura). A fartura só foi encontrada
depois de muitos anos de trabalho e
sacrifícios. Partiram do acidentado
nordeste da Itália, região do Vêneto e encontraram aqui o mesmo perfil
montanhoso de suas terras de origem. A principal diferença era que no RS ainda
havia terra, mato e passarinho à vontade. Também trouxeram seus usos e
costumes, durante muito tempo exclusivos seus e somente muito mais tarde,
lentamente incorporados aos já existentes em nosso Estado. Na alimentação, nos
trouxeram o galeto, a polenta, o salame, as massas e o consumo de radicci.
Tentaram nos trazer o vinho italiano, mas não tiveram sucesso por terem suas
videiras destruídas por pragas e falta de adaptação ao solo e ao clima. No caso
do vinho, foram socorridos pelos descendentes dos alemães que cultivavam viníferas ha muitos anos e já tinham suas cantinas
industriais no vale do Caí. A Revista do Vinho, em seu número 4, ano I, de
janeiro e fevereiro de 1988, publicação da UVIBRA, em artigo “História da uva e
do vinho no Rio Grande do Sul”, em artigo de Rinaldo Dal Pizzol, nos conta à
pg. 30, que um dos casais pioneiros imigrantes
italianos Tommaso e Maria Radaelli, conseguiram os primeiros bacelos de
videira adaptada ao solo e clima, junto
ao imigrante e agricultor Jacob Ruschel, de Linha Feliz, nosso
antepassado pela linha materna. Fato conhecido da nossa família por tradição
oral.
Os alemães, pelo menos tinham os
rios, a estrada que anda, permitindo o transporte fluvial que os imigrantes já
estavam habituados a utilizar nos rios
existentes em sua antiga pátria, para o transporte de pessoas e produção agrícola. Os italianos nem isto.
Os imigrantes depressa aprenderam a não pedir
nem esperar nada do governo. Quanto mais longe das autoridades, melhor. Era a
opinião generalizada. Se o governo não estorvasse, já estava muito bom. Não
mudou muito até hoje. As pendências eram solucionadas com a lógica e a sabedoria
populares da mesma forma como haviam sido resolvidas em suas localidades de
origem na Europa.
Formaram-se então núcleos isolados
de colonização com pessoas de origem, mentalidade e língua diferentes, que
raramente necessitavam comunicar-se entre si. Descendentes
de lusitanos, alemães e italianos mantiveram vivos por muito tempo seus
costumes originais e preconceitos recíprocos, alguns existentes ainda hoje.
A colonização com imigrantes alemães
e italianos, foi a principal responsável pela acentuada diferença econômica
entre a homogênea e operosa metade norte do RS, de pequenas propriedades rurais
e industrial, e a estagnada metade sul, de
latifúndios e sem indústrias, que se acentua cada vez mais. Os
descendentes destes imigrantes não se limitaram ao Rio Grande do Sul. Iniciaram
a diáspora dos gaúchos e estenderam, mais tarde, também o mesmo progresso,
colonizando de forma similar e sem o estorvo do governo, o oeste de Santa
Catarina e sudoeste do Paraná, que são gaúchos em sua mentalidade e condições
sócio econômicas. Apenas a geografia
física os separa. Individualistas, tinham a coragem e o ânimo dos que sempre
serão vencedores. Não havia lugar para fracassados. Hoje, os encontramos no Mato Grosso, Goiás,
Bahia, Rondônia, Roraima, Amazonas, Brasília e em toda a parte. Conhecemos
quase todos os estados do Brasil e muitas vezes, ao nos identificarem como
gaúchos pedem que mandemos mais dessa gente para lá, para serem fatores de
desenvolvimento. Localizamos ainda, famílias Lampert, emigradas do RS para a
Argentina, Paraguai, Estados Unidos, Áustria e Suécia.
A colonização pela pequena
propriedade rural gerou riquezas que levaram as famílias numerosas ter a
necessidade de migração para os demais estados da federação, levando seus
descendentes mais ativos e o capital acumulado pelo rendimento agrícola a
adquirir novas glebas de terras, por sua conta e risco, empobrecendo o RS de
pessoas capacitadas e descapitalizando implacavelmente nosso estado, que perdeu
para sempre homens e capitais que nunca mais retornarão. Este processo, que já
dura meio século, ainda hoje e cada vez mais, continua atual. Seria de esperar
que os agricultores excedentes adquirissem e colonizassem as áreas existentes e
disponíveis na região sul do RS, mas preferiram ir para outros estados, onde se
agruparam por interesses econômicos e não mais por etnias. A democracia racial
se efetivou com naturalidade, ainda que lentamente, mas a discriminação
religiosa continua viva até hoje. Não era tão fácil esquecer e eliminar
preconceitos arraigados na cultura e nas famílias tanto tempo. Possivelmente o
fato da região sul ter sido palco de extrema e
impiedosa violência duas gerações atrás, na época da revolução
Federalista, inibisse qualquer colono pacato a transferir-se para aquela
região.
Outra consequência da geração de
riquezas na zona rural de policultura e pequenas propriedades é a criação de
indústrias artesanais, inicialmente caseiras, logo mais de estabelecimentos
médios nas cidades e por fim transformados em parques industriais que trouxeram
riqueza e progresso a partir dos núcleos iniciais de assentamento dos
imigrantes, alemães nos vales dos rios dos Sinos, Taquari, Caí, Pardo e Jacui e
italianos em cima da serra, na região de Caxias do Sul. A indústria e seu
complemento, o comércio, logo acompanharam a dispersão das colonizações.
Surgiram de humildes iniciativas industriais os atuais grandes empresários que,
graças à sua dinâmica e capacidade administrativa se distinguiram e continuam
impulsionando a formação de novas riquezas.
Com a colonização alemã, D. Pedro I
tinha como objetivo a ocupação das terras de floresta ainda incultas e próximas
da capital e a região missioneira, esta em face da proximidade com os platinos,
sempre inconformados pela permuta efetivada entre Portugal e Espanha daquela
vasta região pela pequena e sempre contestada vila da Colônia do Sacramento, no
extremo sul do Uruguai, de acordo com o tratado de Madri em
Era evidente, também, o desejo de
“branqueamento” da população.
Igualmente, tendo em vista que a
alforria dos escravos não os fazia tornar parte nos mecanismos da produção e da
economia, pois para o ex escravo, na época, o supremo objetivo era o ócio. Ele
passava a trabalhar somente tantos dias quantos eram necessários para sua
sobrevivência, sem capacidade de exercitar seu direito na participação da
economia do regime capitalista, onde poderia e deveria ser inserido. Era mais uma razão para trazer imigrantes
que se constituíssem, com o tempo, em uma pequena burguesia rural e artesanal
que se incorporasse ao processo econômico.
Nem em sonhos o português D. Pedro I e sua
esposa austríaca D. Leopoldina poderiam imaginar que o empreendimento de
iniciar a emigração de agricultores centro-europeus para RS atingisse o sucesso
que alcançou. D. Pedro foi feliz na escolha da época, do lugar e das pessoas.
A
REVOLUÇÃO FARROUPILHA - 1835
Os
emigrantes também não conseguiram livrar-se das guerras no novo mundo e todas
as suas tragédias decorrentes. O imigrante Michael Lampert, 26.12.1817, 6º
filho do imigrante Johann Jakob Lampert (e avô no nosso futuro Marechal do Ar
Miguel Lampert), no decorrer da revolução Farroupilha, foi engajado em
07.05.1838 e serviu no exército legalista, por três anos, como soldado sob o
comando do Major Ferdinand August Maximilian Kersting, Comandante da Cia. de
Caçadores de Voluntários Alemães e defensor vitorioso na luta contra os
Farrapos que tentaram tomar Dois Irmãos, reduto legalista e quando Porto Alegre
e São Leopoldo já se achavam em poder deles. Esse militar era irmão de Carlos
Clemente Kersting, nascido em 28.12.1815 em Celle, Hanôver e falecido em
06.02.1899, casado com Maria Catharina Lampert, 4º filho do mesmo Johann Jakob
(Os Emigrantes Alemães e a Revolução Farroupilha, pg. 196 de Germano Oscar
Moehlecke).
Na
revolução não faltaram os desmandos dos Farroupilhas, quando em pequenos
grupos, dizendo-se mandatários dos revolucionários, atacavam as casas dos
colonos para "requisitar" à força, alimentos, cavalos e gado. Não foram
poucos os que, revoltando-se no ato, foram barbaramente trucidados na frente de
seus familiares. Livros históricos os relacionam.
Por
sua índole pacata, de adventícios no novo continente e por atavismo histórico,
os emigrantes, com raras exceções, ficaram sempre do lado da legalidade. O
Imperador D. Pedro II representava a Lei e a Ordem. Era o único capaz de
sensibilizar os imigrantes para a guerra, depois de tantas más recordações da
pátria de origem. Os imigrantes apenas participaram das lutas fratricidas no
sul, quando seus lares e bens foram atacados e violados pelos revolucionários.
Venceram todas as revoluções pelo lado do Império e da República. É
interessante ver que no RS quem festeja as revoluções são os perdedores. De uma
delas, festeja-se a data do início, 20.9.1835, mas não a data do fim
melancólico, com um arremedo de acordo honroso, em 28.2.1845. Esse acordo foi
assinado apenas por 26 oficiais Farrapos, que enumeravam suas aspirações para a
conclusão da guerra. Era consequência implícita das exigências do Império: Os
Farrapos deviam dar por encerrada a aventura da república: Os Farrapos
aceitavam a monarquia constitucional vigente e reconheciam D. Pedro II como
chefe supremo do Brasil, e o Imperador anistiava os insurgentes. A República Riograndense,
nos seus nove anos vida, jamais foi reconhecida no conserto das nações. Nem o
vizinho Uruguai a reconheceu como país. Em verdade, a República, durante seus
nove anos existência, foi diminuindo de território, a cada ano, até restar
apenas um pequeno reduto em torno de Alegrete, junto à fronteira com o Uruguai
e a Argentina.
Os
Farrapos perderam a revolução no mesmo dia da eclosão da revolta, ao tomar e não conseguir manter mais do que poucos dias suas tropas nos portos de Rio
Grande e São José do Norte, única saída para o mar e decisiva para manter as
tropas do império afastadas do território gaúcho. O porto igualmente era
necessário para a exportação do charque gaúcho, que teve asfixiada sua
atividade pastoril-industrial, reduzindo o preço do gado para um pouco mais de
nada. Perdido o porto, perdida a revolução. Outro erro imperdoável foi permitir
a fuga, por barco fluvial, do Presidente da Província. O governo não foi
deposto, apenas trocou de endereço. A capital passou a ser Rio Grande.
Segundo
o manifesto de Bento Gonçalves, a revolução tinha como objetivo afastar o
Presidente do Estado, por má e odiosa administração e restaurar o império da
Lei, mas mesmo depois de ter sido trocado o Presidente da Província, a
revolução prosseguiu em seu destino.
Em
todo o Brasil, incluindo o Rio Grande do Sul, na época da monarquia, a
população gozava de todas as liberdades e direitos possíveis. Havia uma
Constituição em vigor, respeitada por todos e a população, pelo voto partidário
e livre, escolhia os seus representantes no legislativo. Os gaúchos eram
dirigidos pela aristocracia latifundiária e escravocrata.
Quando
foi deflagrada a revolução Farroupilha, o Rio Grande do Sul desfrutava de
grande prosperidade. Sua principal atividade pecuária, a criação de gado era
altamente valorizada pela produção de charque, destinado à alimentação dos
milhares de escravos mantidos nos estados leste-setentrionais do Brasil. Assim,
nunca poderia ser objetivo dos Farrapos a abolição da escravatura, que somente
levaria sua única produção pecuária a prejuízos, pois perderia os compradores
de charque. Escravo liberto jamais iria comprar charque para sua
alimentação. A escravatura no RS
atingiu o máximo de sua abjeta existência, justamente nos estabelecimentos degradantes
de abate de gado bovino e sua transformação em charque. Já o escravo do
estancieiro, cavalgava e trabalhava em lides campeiras ao lado de seu dono,
comia a mesma comida, corria os mesmos riscos no trabalho e cumpria, no mínimo,
o mesmo horário. Nas revoluções, voluntário ou não, era convocado ao serviço
militar sob as ordens de seu amo e lutava com igual valentia. No calor da
refrega, era matar ou morrer.
Os Farrapos não obtiveram nada do que serviu
como pretexto para a revolução. Ficou no mesmo o valor do imposto na exportação
do charque, perderam a independência e a república, e não obtiveram a alforria
dos escravos que lutaram ao seu lado.
Bastava um ato de vontade, mas não alforriaram nem seus próprios escravos.
Bento Gonçalves, falecido pouco depois do término da revolução, deixou em seu
espólio, como herança, 33 escravos, entre eles, companheiros de luta.
Conseguiram apenas que o imposto sobre o charque importado do Uruguai fosse
elevado para 25%, o que melhorava as condições de competição, e o direito de
indicar o presidente da província, já existente antes da revolução, que acabou
recaindo sobre Caxias, que havia sido o mentor dos últimos movimentos militares
que tiraram por completo as condições dos Farrapos continuarem resistindo por
mais tempo e construtor das condições amenizadas que deram fim ao movimento
guerreiro. Caxias cedeu aos Farrapos muito mais do que estava autorizado a
fazer, assim como David Canabarro concedeu ao Império muito mais do que o limite
imposto por seus companheiros Farrapos. Sem a menor dúvida, o Império
necessitava ter novamente em suas fileiras os militares revoltosos que com
destemor, o haviam enfrentado, de igual para igual, durante quase dez anos.
Eram insubstituíveis. Mas a paz foi feita graças a esses dois patriotas e
transigentes brasileiros. Ninguém reclamou.
Uma
das causas Implícitas que originaram a revolução foi a notícia que seria
cobrado pelo Império um imposto sobre as terras dos pecuaristas. O imposto
territorial, segundo o padre Amstad, seria no valor anual de dez mil reis por
légua quadrada (
A
abolição da escravatura em 1889 foi a causa econômica que deflagrou a revolução
de 1893, quando então sim, pela falta de compradores do nosso charque, as
terras de pecuária e o gado bovino perderam substancial valor, além de novo
arrocho à prática do contrabando.
Já
tarde demais, Bento Gonçalves lamentou a falta de um porto e a inexistência de
navios de guerra suficientes para contrabalançar a armada dos imperiais. Bento
Gonçalves, após o desastre militar na ilha do Fanfa, onde todo o seu exército,
foi aprisionado, inclusive ele próprio.
Quando se encontrava preso em fortaleza do Rio de Janeiro, recebeu a
visita de Giuseppe Garibaldi e com ele contratou o estabelecimento de corso para
atacar os navios mercantes do império, mediante o recebimento de um terço da
carga pilhada do navio atacado, como forma de pagamento (Garibaldi e a guerra
dos Farrapos, de Lindolfo Collor), não ajudou o suficiente. Foi o único
corsário em atividade nos mares e nas águas interiores do Brasil. A busca de um
porto marítimo levou os Farrapos à aventura que terminou no fracasso de tomar e
manter Laguna (SC) e criar a República Juliana. Durante algum tempo, Garibaldi
utilizou o porto para abastecimento do Seival para as atividades de corso. A
resposta do Império não demorou. Ou afundava o Seival ou tomava o seu porto de
abastecimento. Fez os dois. Uma frota de navios de guerra do Império irrompeu
pelo canal de acesso ao porto e derrotou mais uma vez os Farrapos, afundando o
Seival que lutou corajosamente até o fim. Foi a pique na única batalha que
participou. Gloriosamente, afundou crivado de balas e com seus canhões vomitando
fogo sobre os imperiais até o último cartucho. Seu parceiro de travessia
terrestre, o Farroupilha, já havia naufragado em temporal na viagem de
Tramandaí à Laguna. Este navio de guerra afundou sem jamais ter disparado um único
tiro de canhão. Estes heroicos riograndenses não sabiam lutar em batalhas
convencionais e estáticas, nem manobrar navios de guerra ou atirar com
eficiência com os canhões postados na periferia do porto e no canal de acesso.
Seu lugar de combate era a coxilha do pampa. Retornaram ao Rio Grande do Sul,
desfalcados de seus soldados e desiludidos com o esforço despendido em vão.
Acabaram odiados pelos Lagunenses que tinham ido auxiliar. Em poucos meses,
acabaram sendo execrados pelos seus habitantes que inicialmente os receberam
como salvadores. A tomada do porto de Laguna asfixiou o comércio e empobreceu a
população local. A própria ideia do uso do porto de Laguna para as exportações
gaúchas não tinha qualquer viabilidade prática de êxito. Único saldo positivo
da aventura, foi o surgimento de Anita Garibaldi, nossa heroína de dois mundos que
teve um filho nascido em Mostardas no RS. Numa época que a mulher sempre era sempre
submissa, ela, com muita coragem, rompeu com seu casamento infeliz, enfrentou o
preconceito local e foi viver seu amor e sua aventura com Garibaldi.
Mais
tarde, os Farrapos tentaram tomar o porto de São José do Norte. Cavalgaram
quase trezentos quilômetros pela orla do Atlântico, sem ponto de apoio, pela
via que até hoje é chamada de Estrada do Inferno, onde só tem mar, areia,
solidão e tristeza. Garibaldi levou junto consigo Anita, grávida de sete meses,
que ficou abrigada na choupana de um morador dos arredores de Mostardas até o
nascimento de seu primeiro filho. Um desafio aos mais valentes. Passaram, num inverno gelado e chuvoso,
todas as agruras possíveis, que culminaram em mais uma derrota. A armada
imperial de Rio Grande prestou socorro aos defensores de São José de Norte e
foi fator decisivo na batalha.
Sempre
a história é contada pelos vencedores, mas no Rio Grande do Sul, a história é
contada com orgulho pelos vencidos, que cultuam seus heróis, alguns
controversos, omitindo os nomes dos vencedores.
Ficou para sempre a
memória da epopeia da revolução, a bravura e o cavalheirismo de todos os seus
participantes. Foi uma revolução sem degola de prisioneiros.
Os
colonos tinham uma visão diametralmente oposta à dos estancieiros,
protagonistas da revolução, inicialmente de reivindicações, seguida de desafio
à autoridade por mudanças na administração pública, e posteriormente,
separatista e republicana. Os colonos do RS não foram contagiados pela
histórica vocação oposicionista e rebelde do nosso estado, que se perpetua até
hoje. A cidade de Porto Alegre recebeu com apatia inicial a vitória local dos
Farrapos. Apenas aceitou a dominação Farroupilha. Tomada à força, em menos de
nove meses livrou-se do invasor, que apesar de sitiá-la por largo período de
quatro anos, nunca mais voltou a ocupa-la. Nestes quatro anos, a população teve
as suas necessidades e sua fome saciadas unicamente com o fornecimento de
gêneros alimentícios trazido pelos colonos alemães de São Leopoldo que, por via
fluvial tinham acesso à cidade. Os Farrapos conquistaram a cidade mas não
tomaram nenhuma medida de acionar o comércio e evitar a estagnação das
atividades econômicas. Não emitiram moeda e as que giravam na praça foram logo
entesouradas, deixando a população sem possibilidades de sobrevivência
econômica. O episódio da retomada de Porto Alegre, iniciada por um Major do
Império, imigrante alemão, Henrique Guilherme Mosye com apenas mais três
militares legalistas que se evadiram no mesmo dia, mostra que estes tinham a
adesão da população. Por este motivo é que Porto Alegre recebeu do Império o
título de mui leal e valorosa, ostentado até hoje com orgulho. A cidade
homenageia com uma estátua equestre o general Bento Gonçalves, mentor da
revolução, e que foi, durante quatro anos, o algoz que comandou o sítio
infrutífero de Porto Alegre, que suportou estoicamente o cerco férreo, até que
os sitiantes desistiram e se retiraram derrotados. Bento Gonçalves da Silva,
pelos seus valores e desempenho pessoal, projetou-se historicamente à condição
de maior herói do RS.
Não
encontramos qualquer referência do que era feito com os prisioneiros da guerra.
Não foram assassinados e não havia instalações para mantê-los fora de novo
engajamento com os inimigos. Em nosso entender, eram soltos ou apenas trocavam
de lado. Se fosse necessário, em uma batalha próxima trocariam outra vez de
partido. Ser monarquista ou republicano não fazia qualquer diferença para o
convocado analfabeto. Se um General
trocou de lado quatro vezes, por quê um soldado não poderia fazer o mesmo?
A
história da revolução farroupilha não necessita de omissões, mitos, inverdades
e distorções para que continue sendo a maior e duradoura epopeia do Brasil, que
marcou a identidade dos gaúchos para sempre e delineou o nosso imaginário. Basta a verdade nua e crua para que
permaneçamos apaixonados e orgulhosos pelos episódios épicos do decênio
GARIBALDI
Garibaldi,
navegador e teórico da república, foi condenado a morte pela corte Genovesa, então parte do reino
da Sardenha e Piemonte, cujo rei era Carlos Alberto de Savóia. Dessa forma, teve que evadir-se
de sua Itália por participar da fracassada insurreição contra o sistema de
governo monárquico existente. Na época, o rei era a última instância do
condenado a ser executado. Poderia solicitar o perdão ou a transformação da
pena capital em prisão.
Foi para a França e foi novamente perseguido. Fugiu
para a Tunísia e depois para o Rio de Janeiro.
Com assistência da maçonaria teve uma
entrevista com Bento Gonçalves, autoridade militar da República Rio-Grandense e
prisioneiro em fortaleza Imperial no Rio de Janeiro. Afinados, acertaram que lhe seria outorgada
pela república uma Carta de Corso, que o habilitaria a atacar e apreender
navios de guerra ou de comércio com bandeira do Império juntamente com suas
cargas, em troca da metade do butim. Em
seu pequeno barco, tremularia pela primeira vez nos mares o pavilhão tricolor
farrapo. A Carta de Corso mencionava que o barco deslocava 120 toneladas.
A novel república lhe
facilitaria o acesso aos portos marítimos que dispusesse, assim como os dos
“países amigos” para reabastecimento.
Em
poucos dias, Garibaldi
conseguiu tripulação (a maioria de italianos expatriados como ele) e um pequeno barco de cabotagem, que deslocava 20 toneladas – denominado de Mazzini. Armou um
pequeno canhão no convés, escondido entre mercadorias, e aproou ao oceano em
busca de presas. Junto com elas, também alcançou a imortalidade.
Em mar aberto, sob
ameaça, abordou o navio de carga Luiza e tomou-o.
Renomeou o barco apreendido como Farroupilha. Trasladou-se para o novo
barco e desfraldou a bandeira farrapa. Após, afundou o Mazzini.
Como corsário honrado, não tocou nos tripulantes, passageiros e seus
bens pessoais. Mais ao sul deixou-os em terra firme sãos e salvos.
Após tentar vender o produto do
primeiro saque em Maldonado – 54
toneladas de café em grão –, foi perseguido pela marinha uruguaia. Entrando em águas argentinas, foi atacado, sendo ferido no pescoço. Foi preso e teve o seu
barco confiscado, bem como o produto do saque
apreendido. Esteve em relativa liberdade
pessoal em uma pequena vila, onde restabeleceu-se. Na segunda tentativa de fuga a cavalo, via
Uruguai, chegou a Piratini, onde se apresentou para lutar pela república.
Na Argentina, aprendeu a cavalgar.
Guerrear aprendeu com os farrapos.
Construiu em Camaquã dois barcos (o Seival e o Rio Pardo) e praticou atividades de corso nas águas interiores do RS.
Ajustou com a república que o resultado do saque aos navios de comércio do
Império brasileiro seria divididos em três partes iguais, cabendo uma delas a ele próprio. Mais tarde,
cercado no rio Capivarí, conduziu os navios por terra até o mar em
Tramandaí.
Porém, apenas o Seival chegou a Laguna, onde participou da tomada da cidade. O Rio Pardo
naufragara em águas de Santa Catarina. Como corsário, reiniciou com sucesso a
prática de saques de navios cargueiros do Império, contando com uma esquadrilha
de três barcos que atuavam em conjunto: O Rio Pardo, navio Capitânea (ex
Itaparica), comandado por Garibaldi, o Seival e o Caçapava. Lá conheceu e enamorou-se por Anita que seria sua
valorosa companheira.
Meses depois, derrotado junto com os
farrapos em Laguna e após
o colapso da República Juliana, perdeu todos os barcos e o butim obtido
com as atividades de corso que praticou nas imediações do porto de Laguna, retirando-se por terra para o
sul.
Acossado em Curitibanos, teve que
aceitar o combate e
deixou Anita, juntamente com alguns soldados, em guarda da munição. Derrotado,
fugiu para o RS, deixando Anita prisioneira do Império. Anita evadiu-se sozinha
e foi ao encontro de Garibaldi. Já grávida, encontrou-o dias após em Vacaria.
Ao se dirigirem para o sul, os
Farrapos encontraram oposição armada na vila do Imaruí. Canabarro, irritado,
determinou a Garibaldi que tomasse a vila pelas armas e autorizasse o saque das
moradias. Não encontraram riqueza e sim muita bebida alcoólica. Desvairados,
praticaram estupros, roubo de objetos, violências. Garibaldi menciona o fato em suas memórias.
Este ato foi o seu único arrependimento no Brasil.
Acompanharam o exército farrapo em
retirada até Viamão, onde ficaram “abrigados”, certamente em casa alheia.
Mais tarde, com a gravidez de sete meses e sem
lar, Anita acompanhou os
mil farrapos na aventura fracassada de tomar o porto de São José do Norte.
Nos arredores de Mostardas, foi
abrigada em rancho de pescadores –
família Costa –, aguardando
o parto. Garibaldi seguiu para a batalha. Derrotado outra vez em 15 de julho, fugiu
novamente. Poucos dias
antes de nascer seu filho, foi ao encontro de Anita. Nascido o filho Menotti em
16 de setembro de 1840, constatou que não havia roupas adequadas para a criança
nascida em inverno rigoroso. Dirigiu-se a cavalo à Viamão, onde conseguiu auxílio de outro italiano para
comprar as roupas. Retornando a Mostardas, não encontrou mais a mulher e a
criança, que por temor dos Imperiais, fugira com seu filho para os matos, onde
Garibaldi os encontrou.
Os Farrapos determinaram que o casal
fosse mais uma vez abrigado em casa abandonada, à beira da Lagoa dos Patos,
junto a foz do rio Capivari.
Garibaldi, Anita e o filho, no começo de 1841, acompanharam a retirada dos
exércitos farrapos de Setembrina (Viamão), subindo a serra até Vacaria, com
atrozes sofrimentos, frio e fome.
Dali para Passo Fundo, Cruz Alta e finalmente São Gabriel. Participaram
de batalhas como vencidos e vencedores, sem que houvesse qualquer resultado
definitivo. Em suas memórias,
a nomeia de “ritirata disastrosa”.
Garibaldi compreendeu que a
revolução não tinha mais futuro de vitória e sucesso pela inexistência de um
porto marítimo. A paz tinha só um
impasse. Os farrapos queriam um acordo entre países e o Império oferecia
anistia geral aos insurretos. A República Rio-Grandense jamais foi reconhecida
como país por qualquer outra nação. Nem pelo Uruguai. Quatro anos após, a
anistia finalmente foi aceita a contragosto, com o custo de centenas de vidas perdidas
inutilmente em batalhas que não levaram a nada. Um arremedo de acordo de paz
Em março de 1841, com aprovação de
Bento Gonçalves e na maior miséria, decidiram ir de São Gabriel para o Uruguai,
donde mais tarde iriam para a Itália. Garibaldi recebeu pelos serviços que
prestara à república 900 bovinos como pagamento. Mau tropeiro, chegou a
Montevidéu só em junho, com cerca de 300 esquálidas cabeças de gado que foram
vendidas para pagar o custo dos tropeiros contratados e os primeiros gastos em
Montevidéu. Havia pedido anistia, prometendo não mais combater contra o
Império. Foi-lhe concedida.
Poucos anos antes de partirem do
Uruguai para a Itália, Anita, com mais filhos, já casada anteriormente em SC,
ao acreditar no falecimento do seu primeiro marido contraiu um segundo
casamento com Garibaldi.
Pesquisadores nunca
encontraram a sepultura do seu ex-marido.
Anita apresentou-se na igreja como
solteira e analfabeta (mesmo que
trocasse cartas com Garibaldi), e por isso não assinou a documentação. O casamento foi em dia impróprio –
Sábado de Aleluia – e não foi realizado pelo pároco e sim por um padre alheio
àquela igreja. Foram dispensados os proclamas e Garibaldi deu um relógio de
ouro ao padre oficiante. A mãe de Garibaldi jamais aceitou esse casamento como
válido, sendo por isso
motivo de contínuas desavenças entre elas.
Durante certo período – 17 de junho de 1841 até 15 de
abril de 1848 – combateu no
empobrecido Uruguai ao lado do presidente José Fructuoso Rivera, que lhe
atribuiu o comando da pequena esquadra de três navios de guerra em lutas
internas e contra o ditador argentino Rosas. Derrotado em combate, mais uma
vez, mandou incendiar a frotilha. No Uruguai, como mercenário mal pago, foi
sempre um enteado da sorte. Viveu em extremas dificuldades financeiras,
suportadas com coragem por Anita. Em 27 de dezembro de 1847, mandou a esposa e
filhos para a Itália e logo seguiu-os. Lá, em outra fuga continuada após mais derrotas e fugas na
Itália, Anita (grávida novamente) encontrou a morte sem qualquer
assistência. Garibaldi, acuado, reiniciou a fuga e solicitou a terceiros que
sepultassem Anita. Com medo dos austríacos que proibiam qualquer auxilio aos
rebeldes, o fizeram em surdina em cova rasa, clandestina, num monturo e com
medo de peste, arrastaram-na com uma corda pelo pescoço. Cinco dias após,
apareceu o braço da Anita. Avisada a polícia austríaca, o legista, em razão de
marcas de corda no pescoço e traqueia rompida, atestou, erradamente, morte de
Anita por enforcamento e denunciou Garibaldi como assassino. O falecimento
natural de Anita foi, na verdade, assistido por várias pessoas. Com o atestado
de óbito, foi levada em uma carroça e sepultada num pequeno cemitério. Somente
dez anos depois, seus despojos foram trasladados para uma sepultura condigna.
A História dignificou-a como
figura exemplar, estoica, esposa, mãe e guerreira. Hoje existe em Laguna museu e estátua em sua
homenagem. Seus valores
servirão de modelo, pois,
mesmo não tendo nascida gaúcha, é orgulho nosso.
Em suas memórias, Garibaldi faz
mínimas referências à Anita e aos farrapos. Lamentou não dispor na Itália de
cavalaria igual à dos exércitos farrapos.
Há mais em outras fontes: O padre em exercício da
vice-presidência da República Juliana, em Laguna, entrou sem avisar na sala do
general e deparou-se com
Canabarro, de calças arriadas, mantendo relação sexual com uma lagunense
encostada em sua escrivaninha. Saiu aos gritos de “vi o demônio”. Lá se
finalizou a ruptura entre os Farrapos e a República Juliana.
Após a retirada dos Farrapos, o
padre foi encontrado nas ruas de Laguna, morto, nu e castrado.
Tempos depois, em nova situação
política na Itália, Garibaldi foi o herói que congregou todas as forças e levou
à unificação do seu país. Apesar de ser
um antimonarquista declarado e ativo, Garibaldi acabou encontrando a glória ao
contribuir para a unificação da Itália sob a monarquia de Vitor Emanuel II,
filho de Carlos Alberto, soberano da Sardenha que abrangia Gênova – e cuja corte condenara Garibaldi
a morte em 1834, mais de vinte anos antes, por atividades violentas contra a monarquia. Quem diria.
Carlos Alberto de Savóia era rei da Sardenha e
Piemonte em 1832 e pai de Vitor Emanuel II, rei da Sardenha e Itália unificada,
de 23-3-1849 a 17-3-1861. Lutou para que o filho do rei que o condenara a morte
fosse o rei que unificaria a Itália.
Terminada a luta, Garibaldi recebeu
do rei, como compensação de sua participação nos combates, a propriedade de
toda a ilha de Caprera, onde bem mais tarde faleceu.
Esta foi a vida de um controverso
aventureiro, mercenário, soldado da fortuna, que nunca lutou sem vantagem
econômica.
Os povos necessitam ter heróis para reverenciar.
Bibliografia: Entre
outros, livros: História de Santa Catarina, do lagunense Oswaldo R. Cabral –
Editora Laudes (vide Google), Anita
Garibaldi, de Paulo Markun – Editora SENAC – São Paulo.- ZH de 7-9-2011 pg 29,
Dicionário Farroupilha – Garibaldi e a Guerra dos Farrapos, de Lindolfo Collor.
– Vitor Emanuel II da Itália de Marcos Júnior (Wikipédia - Google) – Expedição
dos Mil (Wikipédia)
A seguir, biografia de
Vitor Emanuel II e relato da “Expedição dos Mil”, encontrado Wikipédia no Google.
A EXPEDIÇÃO DOS MIL
A expedição dos mil (em italiano Spedizione dei Mille) foi um evento do
Risorgimento italiano, que ocorreu em 1860. Um corpo de voluntários liderados
por Giuseppe Garibaldi desembarcou na Sicília, a fim de conquistar o Reino das
Duas Sicílias, governada pelos Bourbons.
O projeto era um empreendimento
ambicioso e arriscado com o objetivo de conquistar, com mil homens, um reino
com um exército regular maior e uma marinha mais poderosa. A expedição foi um sucesso
e foi concluída com um plebiscito que trouxe Nápoles e Sicília para o Reino da
Sardenha, a última conquista territorial antes da criação do Reino da Itália,
em 17 de março de 1861.
A perigosa empreitada ao mar foi a única
ação desejada que fora decidida conjuntamente pelos "quatro pais da
nação" Giuseppe Mazzini, Giuseppe Garibaldi, Victor Emmanuel II, e Camillo
Cavour, que perseguiam objetivos divergentes. No entanto, a expedição foi
instigada por Francesco Crispi, que utilizou sua influência política para
reforçar o projeto de unificação italiana.
Os vários grupos participaram da
expedição por uma variedade de razões: para Garibaldi, objetivo era conseguir
uma Itália unida; à burguesia Siciliana, uma Sicília independente como parte do
reino da Itália, e para os agricultores de massa, distribuição de terras e o
fim da opressão.
Os eventos da expedição foram
realizados dentro do processo global de unificação da Itália, que foi em grande
parte orquestrada por Camillo Cavour, o primeiro-ministro da Sardenha-Piemonte,
como o trabalho de sua vida. Após a anexação do Grão-Ducado da Toscana, os
Ducados de Modena e Parma e da Romagna para Piemonte em março 1860, os
nacionalistas italianos voltaram seus olhos para o Reino das Duas Sicílias (que
compreendia toda a Itália continental sul e Sicília), como o próximo passo em
direção ao seu sonho de unificação de todas as terras italianas.
Em 1860, Garibaldi, já o mais famoso
líder revolucionário italiano, foi à Gênova planejando uma expedição contra a
Sicília e Nápoles, com o apoio secreto do Reino Unido. Líderes da Sicília,
entre eles Francesco Crispi, estavam descontentes com a regra napolitana sobre
a ilha. Além disso, a Grã-Bretanha estava preocupada com as abordagens dos
napolitanos em direção ao Império Russo, em tentativa deste último a abrir o
seu caminho para o Mar Mediterrâneo; a importância estratégica dos portos da
Sicília foi também por terem aumentado drasticamente pela abertura do Canal de
Suez. Foi também sugerido (por Lorenzo del Boca, entre outros) que o apoio
britânico para a expedição de Garibaldi teria sido estimulado pela necessidade
de obter condições econômicas mais favoráveis para o enxofre da Sicília, que
foi necessário em grandes quantidades para os novos navios a vapor.
O Reino da Sardenha-Piemonte precisava
de um casus belli (fato considerado suficientemente grave pelo Estado
ofendido) apresentável, a fim de atacar o Reino das Duas Sicílias. Isto
foi necessário para a Casa de Sabóia que, no entanto, nunca deu qualquer declaração
de guerra contra o reino Bourbon, uma condição necessária, uma vez que este foi
um dos requisitos apresentados para Cavour. A única ocorrência que teria
satisfeito este requisito foi uma revolta vinda de dentro. Tal evento teria
sentido a alienação das pessoas para a dinastia que governou em Nápoles e, em
particular, a incapacidade de Francisco de Bourbon para garantir políticas
públicas aceitáveis em seus domínios. A Sicília, como mostra a história das
últimas décadas, foi um terreno fértil e o sul, liberal, especialmente aqueles
retornando após uma anistia concedida pelo jovem rei, que trabalhou nesse
sentido por algum tempo.
Em março de 1860, Rosolino Pilo exortou
Giuseppe Garibaldi para tomar conta de uma expedição para libertar o Sul da Itália
da regra dos Bourbon. De início, Garibaldi foi contra, mas acabou concordando.
Em maio de 1860, Garibaldi tinha recolhido 1089 voluntários para sua expedição
à Sicília
O maior número de voluntários veio da
Lombardia (434). Outros números significativos de voluntários vieram da Veneza
ocupada (194), Genova (156) e Toscana (78). Havia cerca de 45 voluntários da
Sicília e 46 voluntários napolitanos - mas apenas 11 a partir de Roma e dos
Estados Papais. Trinta e três estrangeiros se juntaram à expedição, entre eles
István Turr e outros três húngaros e quatorze italianos do Trentino do Império
austríaco. A maioria dos voluntários eram estudantes e artesãos das classes
mais baixas.
Os 1.089 voluntários foram mal armados
com mosquetes, e estavam vestidos com um uniforme minimalista, constituído por
uma camisa vermelha e calça cinza.
Durante a noite de 05 de Maio, um
pequeno grupo liderado por Nino Bixio capturou dois navios a vapor em Genova,
que eram da empresa de transporte Rubattino, a fim de transportar os
voluntários para a Sicília. Eles levaram os dois navios, cujos nomes eram Il
Piemonte e Il Lombardo, para as rochas próximas, em Quarto, onde os voluntários
(incluindo a esposa de Franceso Crispi, Rosalie) embarcaram para a Sicília.
Os navios desembarcaram em Marsala, na
ponta mais ocidental da Sicília, em 11 de Maio, com a ajuda de navios
britânicos presentes no porto para dissuadir os navios de Bourbon. Il Lombardo
foi atacado e afundou, mas somente após o desembarque ter sido concluído, enquanto
Il Piemonte foi capturado. Tal desembarque foi precedido pela chegada de
Francesco Crispi e outros, que tinham a tarefa de conquistar o apoio dos
moradores para os voluntários.
Em 14 de maio, em Salemi, Garibaldi
anunciou que estava assumindo ditadura sobre Sicília em nome do rei Vitor
Emmanuel II da Sardenha.
Os Mille
ganharam a primeira batalha em Calatafimi, contra cerca de 2.000 tropas
napolitanas em 15 de maio. A batalha impulsionou o moral dos Mille e, ao mesmo tempo, deprimiu os
napolitanos, que foram mal conduzidos por seus oficiais superiores, muitas
vezes corruptos, e começaram a sentir-se abandonados. Tendo prometido terras a
todos os homens que se voluntariaram para lutar nas fileiras dos Mille contra os Bourbons, aos Mille somaram-se mais duzentos homens
locais. Em 27 de maio, com a ajuda de uma insurreição popular, os Mille cercaram Palermo, capital da ilha.
A cidade foi defendida por cerca de 16.000 homens, mas estes estavam sob a
direção confusa e tímida do general Ferdinando Lanza, aos 75 anos
(provavelmente um dos oficiais napolitanos subornados com dinheiro Inglês).
Enquanto duas colunas de Garibaldinos
atacaram o perímetro, parte da população, reforçada por 2.000 prisioneiros
libertados das cadeias locais, se levantaram contra a guarnição. Quando suas
tropas foram conduzidas de volta à maioria das suas posições, Lanza
ordenou-lhes que bombardeassem a cidade por três dias, causando a morte de 600
civis. Até 28 de maio, Garibaldi havia controlado grande parte da cidade e
declarou que a autoridade Bourbon havia sido deposta. No dia seguinte, uma
contra ofensiva napolitana desesperada foi levada de volta, e Lanza pediu uma
trégua. No entanto, quando um grupo de reforço de tropas treinadas e bem
equipadas chegou à cidade, a situação tornou-se muito grave para Garibaldi, que
foi salvo apenas pela decisão de Lanza em se render. Através da mediação de um
almirante britânico, um armistício foi assinado e a frota napolitana abandonou
o porto.
As
tropas dos Bourbon foram ordenadas a ir para o leste e evacuar a ilha. Uma
insurreição que eclodiu em Catânia em 31 de maio, liderada por Nicola Fabrizi,
foi esmagada pela guarnição local, mas a ordem de partir para Messina
significava que esse sucesso tático napolitano não teria resultados práticos.
Na época, apenas Syracuse, Augusta,
Milazzo e Messina permaneceream nas mãos reais na Sicília. Nesse meio tempo
Garibaldi emitiu sua primeira lei. A imposição não conseguiu reunir mais de
20.000 soldados, enquanto os camponeses, que esperavam um alívio imediato das
condições dolorosas a que foram forçados pelos latifundiários, revoltaram-se em
várias localidades. No Bronte, em 4 de agosto de 1860, o amigo de Garibaldi
Nino Bixio reprimiu de forma sangrenta uma dessas revoltas, com dois batalhões
de camisas vermelhas.
O ritmo das vitórias de Garibaldi
tinha preocupado Cavour, que no início de julho o enviou uma proposta de
anexação imediata da Sicília para Piemonte. Garibaldi, no entanto, se recusou
veementemente a permitir tal movimento até o final da guerra. O enviado de
Cavour, La Farina, foi preso e expulso da ilha. Ele foi substituído pelo
maleável Agostino Depretis, que ganhou a confiança de Garibaldi e foi apontado
como pró-ditador.
Em 25 de Junho de 1860, o rei
Francisco II, das Duas Sicílias, tinha emitido uma constituição. No entanto,
esta tentativa final de conciliar seus súditos moderados não conseguiu
despertá-los para defender o regime, enquanto os liberais e revolucionários
estavam ansiosos para receber Garibaldi.
Na época, Garibaldi havia criado o
Esercito Meridionale ("Exército do Sul"), reforçado por outros
voluntários da Itália e alguns soldados do Piemonte disfarçados de
"desertores". Os napolitanos tinham reunido cerca de 24.000 homens
para a defesa de Messina e as outras fortalezas.
Em 20 de julho Garibaldi atacou
Milazzo com 5.000 homens. A defesa napolitana era galante, mas novamente a
ausência de coordenação e a recusa do Marechal Clary, comandante-em-chefe do
exército na ilha, para enviar reforços de Messina concedeu aos Mille mais uma vitória. Seis dias depois
Clary rendeu a cidade de Messina a Garibaldi, deixando apenas 4.000 na cidadela
e outros fortes. Os outros redutos se renderam até o final de setembro.
Em 19 de agosto, os homens de
Garibaldi desembarcaram em Calábria, em um movimento de oposição a Cavour, que
tinha escrito ao Ditador uma carta pedindo-lhe para não cruzar o estreito.
Garibaldi, no entanto, desobedeceu, um ato que teve a aprovação silenciosa do
rei Victor Emmanuel.
Os Bourbons tinham cerca de 20.000
homens na Calábria mas, para além de alguns episódios como o de Reggio Calábria,
que foi conquistada a um alto custo por Bixio em 21 de agosto, eles ofereceram
resistência insignificante, como numerosas unidades do exército Bourbon
dissolvida espontaneamente ou mesmo se juntando às fileiras de Garibaldi. Em 30
de agosto, um exército siciliano conspícuo, liderado pelo Gen. Ghio, foi
oficialmente dissolvido em Soveria Mannelli, enquanto apenas as pequenas
unidades e unidades dispersas continuaram a luta. A frota napolitana se
comportou de forma semelhante.
O Rei Francisco II foi, assim, forçado
a abandonar Nápoles e entrincheirar-se na fortaleza formidável de Gaeta,
enquanto um último posto foi criado no rio Volturno, ao norte de Nápoles. Em 07
de setembro, Garibaldi tomou posse de Nápoles, com poucos danos (ele entrou na
cidade pelo trem), saudado como um libertador pela população.
Entretanto, o Reino da Sardenha
invadiu os Estados Papais, conquistando a Itália Central (Lazio excluída)
através de algumas batalhas como a Batalha de Castelfidardo, e entrou no Reino
das Duas Sicílias, juntando-se a Giuseppe Garibaldi.
Na batalha decisiva da Volturnus (1 e
2 de Outubro), Garibaldi, com uma força de 24.000 homens, não foi capaz de
derrotar de forma conclusiva o Exército napolitano (cerca de 25.000 homens).
Somente a chegada do exército da Sardenha ultrapassou a última força Bourbon
organizada, para consolidar Gaeta.
Poucos dias depois (21 de outubro) um
plebiscito confirmou a anexação do Reino das Duas Sicílias ao Reino da Sardenha
por uma maioria esmagadora.
O final da expedição é
tradicionalmente definido com a famosa reunião em Teano (norte da Campânia)
entre Victor Emmanuel II e Garibaldi (26 de outubro 1860). Outros atribuem o
final da campanha a entrada do Rei em Nápoles no dia 7 de Novembro.
No entanto, a campanha militar ainda
não havia sido totalmente concluída, afinal Francisco II se rendeu somente em
fevereiro do próximo ano, quando finalmente se rendeu ao exército da Sardenha
liderado por Enrico Cialdini, e partiu para o exílio nos Estados Papais. Pouco
tempo depois, em Março de 1861, o novo Reino da Itália (Regno d'Italia) foi
formalmente estabelecido.
Garibaldi pediu ao rei que
permanecesse com as Duas Sicílias por um ano, enquanto ditador. Ele também
pediu que seus oficiais fossem integrados no novo exército italiano. Quando
Victor Emmanuel II se recusou a aceitar seus pedidos, ele voltou para Caprara.
A Expedição dos Mil tem sido
tradicionalmente um dos eventos mais famosos do Risorgimento italiano, o
processo de unificação da Itália.
Nos anos seguintes, o aumento da
resistência local (o chamado brigantaggio ou banditismo), requereu em certo
ponto a presença de cerca de 140.000 tropas piemontesas para manter o controle
do antigo Reino das Duas Sicílias. Tradicionalmente, a manipulação do
brigantaggio recebeu um julgamento negativo por historiadores italianos, em
estrito contraste com o heroísmo atribuído a Garibaldi e seus seguidores; o
historiador Inglês Denis Mack Smith, por exemplo, aponta as deficiências e
reticência das fontes disponíveis para o período.
A expedição, além disso, obteve o
apoio dos poderosos latifundiários do sul da Itália em troca da promessa de que
suas propriedades fossem deixadas intactas no próximo acordo político.
Numerosos camponeses sicilianos, no entanto, tinham aderido aos Mille esperando a redistribuição da
terra para as pessoas que trabalhavam nelas. As consequências deste
mal-entendido se tornaram evidentes em Bronte.
Traduzido do Google por João Paulo Milanez de Souza
A RETOMADA DE
PORTO ALEGRE
História é a verdade. Toda
a verdade. Nada mudará nosso orgulho pelo passado do Rio Grande do Sul. Dois séculos de lutas quase contínuas que
formaram nossa identidade.
No dia 20 de setembro de 2007 ZH
publicou suplemento com primoroso e conciso trabalho histórico, intitulado “No
Tempo dos Farrapos”. Entre os 19 principais confrontos está o de 15 de junho de
Na maioria dos livros históricos
gaúchos este episódio é tratado superficialmente e não revela atos oportunos e
heroicos, sem precedentes, realizados por um imigrante de nome Henrique
Guilherme Mosye, tenente do Império e mais três militares companheiros, todos prisioneiros de guerra, sargento Sinzenando
Antônio de Oliveira, sargento furriel Francisco das Chagas Júnior e mais
um cadete anônimo, que desencadearam a
reação dos legalistas.
Sem dúvida, Porto Alegre era uma
cidade portuária e sua economia gravitava em torno do porto e dos navios que
ali ficavam fundeados.
À partir da conquista da cidade pelos
Farrapos, durante cerca de nove meses, nenhum navio ali atracou, restringindo a vida econômica da cidade.que vivia em função de
ferrarias, carpintarias, cordoarias, oficinas, estabelecimentos comerciais que
não conseguiam renovar seus estoques, estivadores, carroceiros tabernas,
hotéis e bordéis Também, funcionários do
governo e militares adesistas, deixaram
de receber seus proventos em dia, pois os Farrapos não tinham no erário valor
que suportasse essa sangria mensal.
Acabou a circulação da moeda e as poucas existentes ficaram entesouradas
como é normal em economia política. Gerou dificuldades financeiras para todos e
a responsabilidade foi atribuída aos Farrapos. Desespero generalizado e
arrependimento. .
Uma reação já vinha sendo articulada
por Manoel Marques de Souza, líder militar, preso no navio Presiganga, que já
recebera informações da inconformidade da população com a situação política e
econômica reinante. Civis e militares da cidade já estavam se arregimentando
para expulsar os Farrapos. Faltava o momento propício de precipitar a revolta.
Estes quatro personagens, aprisionados
em Pelotas no dia 20 de setembro, pressentiram que o momento tinha chegado,
deram início, após terem se evadido da cadeia, da sublevação que culminou no
mesmo dia com a retomada da cidade de Porto Alegre, sem qualquer auxilio
externo, sem terem disparado um único tiro e sem qualquer ferimento de arma
branca. A reação Imperial progrediu de forma geométrica e mais de 700 soldados,
oficiais, comandante das tropas e todas as demais autoridades civis farrapas
foram aprisionadas. Foi a maior façanha da Revolução Farroupilha.
Os Farrapos perderam Porto Alegre para
sempre, que recebeu do Imperador o título de cidade mui leal e valorosa.
Anos depois e pelos mesmos motivos, os
Farrapos perderiam o porto de Laguna.
Só mais tarde, no mesmo dia,
libertaram os oficiais do Império que se achavam detidos no navio-prisão
Presiganga, que assumiram a administração da cidade. Reclamaram por não terem
sido avisados com antecedência.
Na verdade, nem confronto houve.
Não existe na História Universal,
qualquer fato similar que se possa comparar. Nunca tão poucos realizaram tanto
num único dia. A retomada, de uma cidade ocupada pelo invasor, iniciada por
quatro soldados desarmados que se evadiram naquele momento, sem luta, ainda
hoje, é impensável.
Estes verdadeiros heróis nunca receberam
as homenagens merecidas, seus nomes raramente foram mencionados e nem o fato
singular é divulgado.
As altas patentes militares foram
promovidas e agraciadas com títulos honoríficos. O tenente foi transferido para
Pelotas por reclamar uma promoção que jamais chegou. Os quatro não são nem nome
de rua ou beco. São uns renegados. Ainda é tempo de resgatarmos a sua história
e nos orgulharmos deles.
IMIGRANTES EM TRÂNSITO
Até o início da Revolução Farroupilha, em 1835, o RS recebia cerca de
1000 imigrantes germânicos por ano, movimento devidamente supervisionado pelo
governo imperial. Levas de imigrantes em trânsito eram uma constante e a
eclosão da revolta Farroupilha impossibilitou
o controle dos assentamentos. O Império simplesmente suspendeu as
imigrações que vinha patrocinando para o RS e os colonos que já haviam tomado a
resolução de emigrar tiveram só duas escolhas: permanecer na Europa ou aceitar
o convite para emigrar para a cidade de Petrópolis, na Província do Rio de
Janeiro. Aceitaram-no. Talvez fosse bom,
talvez não. Na verdade, queriam mesmo era se estabelecer junto aos seus
parentes que já se encontravam na Província do RS e que os estavam esperando.
As revoluções são temporárias, mas a Farrapa se estenderia por dez
anos.
A família de Peter Jacob Wasem partiu de Bremem, via Dunquerque, na Europa, pela nau Leopold, e chegou após 45
dias de viagem, em 21 de julho de 1845 e foi
conduzida ao seu destino contratado. Depois seria depois. A
contragosto, lá permaneceram como
assalariados durante nove meses.
A Província do RJ conduziu os
imigrantes para trabalhar na construção do palácio de verão da família Imperial
em Petrópolis e estradas de acesso. Não era o que os imigrantes desejavam.
Queriam era trabalhar na terra.
Como dissemos, em 1835 cessou completamente o fluxo de imigrantes para o
RS. Somente em 1844 iniciou-se modesto recomeço de chegada de colonos alemães,
apenas
Encerrado o decênio revolucionário em
1845, os colonos que tinham
anteriormente optado para se assentar em Petrópolis, tomaram as medidas que seriam necessárias
para, finalmente, chegar ao RS e encontrar seus parentes. Sabiam onde estavam.
Encaminharam petição ao Imperador, nos termos
seguintes:
"Senhor!
"Com infinitésima veneração que
é devida a Vossa Majestade Imperial, dizem os colonos abaixo assinados, para
esta Côrte chegados, expedidos pela casa Delrue & Cia., na cidade de
Dunquerque, com a nau prussiana "Leopold", o francês
"Marie" e o inglês "Agripina", por custas da Província do
Rio de Janeiro.
"Eles os ditos Colonos são obrigados
à Província, pôr este ato de benignidade e amarrados a ela com suas qualidades.
Porém os suplicantes são gente bem destra na cultura do arroz e em nenhum ramo da
indústria eles podem ficar tão útil neste Império e explicar seus sentimentos
de agradecimentos, como naquele. Por consequência disto, eles dirigem-se
humildemente para a clemência de Vossa Majestade Imperial rogando que
lhes queira conceder aos suplicantes ir para a Província do Rio Grande de
São Pedro do Sul, aonde a Agricultura está na maior flor e aonde eles já tem
seus parentes e conhecidos, dos quais eles receberão assistência para o seu
estabelecimento econômico.
"Os
suplicantes confessam com muita vontade, como eles ante a evidência disto, tem
de restituir ao Governo da Província do Rio de Janeiro, as despesas de viagem
da Alemanha para o Rio de Janeiro; e com muita vontade eles declaram-se prontos
a prestar a sua obrigação; porém uma parte deles está inteiramente tão pobre,
que não tem nada; uma outra parte tem só pouco, assim que para os tais é
impossível; desta razão eles rogam a Vossa Majestade Imperial que lhes queira
determinar a restituição das despesas por sua viagem da Alemanha para lá, que
foi a Província do Rio de Janeiro; e eles declararam-se prontos assinar um
documento por cuja virtude eles serão obrigados a pagar as suas
dívidas na Tesouraria do Império em tempo de três anos, e por certeza do
Governo, eles prestarão fiança com todos os seus bens, especialmente com
o terreno que eles esperam da benignidade de Vossa Majestade Imperial, com
todas as suas benfeitorias; sobre isto prestarão todos juntos fiança por cada
um em espécie, assim se um
escapar os outros
todos pagarão pôr
ele ao Governo
a sua dívida, a respeito das
despesas de viagem.
"Finalmente os Suplicantes dirigem ainda mais esta petição para
clemência de Sua Majestade Imperial de conceder-lhes o benefício, mandá-los
para o Rio Grande de São Pedro do Sul com uma Nau do Império e livre das
despesas de viagem. Nunca eles acabarão de oferecer os sacrifícios de seus
agradecimentos pela sua diligência e fidelidade na sua esfera da atividade e
veneração com que serão de Vossa Majestade Imperial submissos vassalos. Por
isto.
Rio de Janeiro,
13 de agosto de 1845.
1. Nicolau Schuck com 1 mulher e 8
filhos
2. Pedro Wolf com 1 mulher
3. Nicolau Schaefer com 1 mulher e 5
filhos
4. Miguel Bender com 1 mulher e 5
filhos
5. Matias Ohlweiler com 1 mulher e 10 filhos
6. Pedro Scherer com 1 mulher e 5
filhos
7. Jacob Wilbert com 1 mulher e 4
filhos
8. Henrique Filper com 1 mulher e 6 filhos
9. Pedro Borniger com 1 mulher
10. Ludovico Grassmann com 1 mulher e 3
filhos
11. Francisco Filipo Filper com 1 mulher e 3
filhos
12. George Palen com 1 mulher e 5 filhos
13. Henrique Plenz, solteiro
14. Andreas Zanius, com 1 mulher e 4
filhos
15. João Link com1 mulher e 2 filhos
16. Cristovão Bender com 1 mulher e 7 filhos
17. Matias Muller com 1 mulher e 4
filhos
18. João Kopp com 1 mulher e 4 filhos
19. Henrique David Heidrich c/ mulher e
4 filhos
20. I.D. Heidrich, solteiro
21. Francisco Sauvrassig com mulher e 2
filhos
22. Jacob Wagner, solteiro
23. Nicolau Engelmann com 1 mulher
24. Henrique Strassburger
25. PETER JACOB WASEM com mulher e 4 filhos
(entre eles PETER JACOB LAMPERT, 4ª emigração, enteado, filho de um primeiro
casamento de sua mãe Elisabeth Gülsdorf e
pela repetição dos prenomes, seu afilhado).
26. Jacob Kaspar
27. Filipo Strassburger
Obtiveram aprovação do seu pleito e em 26 de
março de 1846 finalmente, chegaram A Porto Alegre pelo brigue Bella Manoella e
foram distribuídos segundo os interesses de cada um. Peter Jacob Wasem
(20-12-1801) casou com a viúva e sua segunda esposa Elisabeth Gülsdorf (11-1902
e 1-3-1852) e mãe do Peter Jacob Lampert, vieram para Dois Irmãos, depois
Brochier e finalmente para Conventos, sempre com seus parentes Lampert ali
residentes. Constatamos que nosso Peter Jacob Lampert – não descobrimos o nome
do pai dele - recebeu confirmação na igreja de Hamburgo Velho (com sobrenome
Wasem) em 1849, junto com seu irmão de criação Jacob Wasem e batizou uma
criança, filha de seu padrasto, em terceiras núpcias, com Margaretha Renner em
Brochier, em 1854. Depois disso, desapareceu dos registros. Não encontramos
descendentes nem óbito. Talvez algum dia encontremos seu túmulo em Brochier,
Maratá, Poço das Antas ou Salvador do Sul.
Localizamos que o filho de Peter Jacob Wasem,
de nome Jacob Wasem, casado com Catharina Renner, em 1873, batizou seu segundo
filho Felipe e mais três na igreja evangélica de Conventos em Lajeado.
Constatamos que pai viúvo e filho, desposaram tia viúva e sobrinha.
Essa,
a saga de 27 famílias, 120 pessoas. Atendendo ao convite do Império, se
dispuseram a vir para o Brasil buscando felicidade e farturas prometidas.
Momento inoportuno e circunstâncias alheias as desviaram de seus objetivos
iniciais. Sem esmorecimento lutaram e lutaram.
ATA DOS FARRAPOS
Revirando minha
biblioteca histórica, reencontrei “Enciclopédia Rio-grandense, de
Ela tem oito redatores,
e no tópico Rev. Farroupilha o historiador é Walter Spalding, do Inst. Hist. e
G. do RGS e do brasileiro.
Entre outras coisas,
encontrei a ata completa do acordo havido entre os Farrapos em 25-2-1845 para
finalizar a guerra, com suas 12 reivindicações, existente em todos os
trabalhos. As cláusulas, em sua maioria, já vieram prontas do Rio de Janeiro.
Contudo, na ata, logo
depois e em sequência às 12 condições
consta mais a seguinte frase ....
E TODAS QUANTAS SE PUDESSEM MAIS CONSEGUIR COM O BARÃO DE CAXIAS, omitida nos
demais trabalhos disponíveis.
Esse adendo, em meu
entender, modifica a simples leitura das 12 exigências, pois reflete claramente
que elas ainda não tinham sido concedidas por Caxias.
Como sabemos, Caxias nunca
deu nada por escrito e não atendeu o pedido de alforria dos escravos que
lutaram ao lado dos Farrapos. Envolvia legislação Federal e fugia da alçada
dele. Um escravo valia 20 vacas e era um bem patrimonial, utilizável ou
vendável garantido por Lei. Desconheceu-o
e nenhum Farrapo reclamou. Os Farrapos, se o quisessem, poderiam ter alforriado
seus próprios escravos, bastava uma carta de alforria, mas não o fizeram.
Em nosso entender, a
inclusão desse item nas reivindicações dos Farrapos visava apenas evitar a
rebelião dos escravos e dar uma aparência de magnanimidade.
Cada Farrapo tratou de
sua vida e os escravos lanceiros negros
ficaram sem padrinho. Retornaram aos seus primitivos donos ou enviados
ao Rio de Janeiro.
Dia 28, Canabarro e em nome do
Presidente da República, Lucas de Oliveira, fizeram proclamações em separado, e
declararam o fim das hostilidades, sem mencionar quaisquer exigências. Foram
todos anistiados.
Caxias determinou aos Farrapos que
se dirigissem ao Poncho Verde para fazer entrega dos escravos e dos armamentos
No dia seguinte recebeu-os (inclusive Netto) em seu acampamento às margens do
rio Santa Maria. .
Em 1-3-1845 Caxias fez uma
proclamação, se congratulando e informando que por decreto do Imperador
(18-12-1844) o passado Farrapo seria esquecido, finalizando com vivas ao
Imperador e à integridade do Império.
No mesmo dia, os Farrapos o escolheram
para presidir o Estado. Afora sua conduta impecável, Caxias era necessário para
que se cumprissem os acordos verbais pactuados. O principal era a manutenção
dos militares (menos os generais), com dignidade, nos seus postos originais do
exército Imperial.
26 militares Farrapos assinaram a
ata: Canabarro, Netto (em segundo) e entre outros, Tomás José Pereira, Tte.
Cel.. No livro que herdei do meu pai, na margem dessa página e junto ao nome
consta a anotação confiável dele, a lápis,
“bisavô de Carlos Pereira Marques” seu genro.
Aos generais e ministros, Caxias
ofereceu e concedeu indenizações em dinheiro para compensar em parte as perdas
de cada um com a Revolução. Apresentaram as suas contas e respectivos recibos.
Puderam assim, recomeçar sua vida econômica. (História Regional da Infâmia de
Juremir M. da Silva)
ANEXO DE
FARRAPOS –
MOACYR FLORES
Livro História do Rio Grande do Sul – pg 87
Juan Manoel de Rosas, presidente da
Argentina, ofereceu dinheiro à Bento Gonçalves para a continuação da guerra
civil, pois pretendia lutar contra o Império. Com essa ameaça estrangeira, Antônio
Vicente da Fontoura conseguiu do governo imperial a indenização aos chefes farrapos. No início de fevereiro todos os chefes
farroupilhas pediram e receberam anistia. Caxias determinou que os farrapos se
reunissem na fazenda dos Cunhas,
Professor de história na
UFRGS aposentado
LUTA E PAZ
A CAUSA
LUTA
– Proclamação de Bento Gonçalves no 1ª dia da Revolução ....... Conheça o
Brasil que o 20 de setembro de 1835 foi a consequência inevitável de uma má e
odiosa administração. E que não tivemos outro objeto, e não nos propusemos
outro fim, que restaurar o império da Lei, afastando de nós um administrador
inepto e faccioso, sustentando o trono do nosso Jovem Monarca e a integridade
do Império.
O DESFECHO
PAZ
- Manhã de 28 de fevereiro de 1845, Davi Canabarro manda formar sua gente e,
solenemente, lê sua proclamação:
-
Concidadãos – Completamente autorizado pelo magistrado civil à quem obedecemos
e na qualidade de comandante em chefe contando com a unânime vontade de todos
os oficiais da força do meu mando, vos declaro que a guerra civil que há mais
de nove anos devasta este belo país está acabada. A cadeia de sucessos por que
passam todas as revoluções tem transviado o fim político a que nos dirigíamos,
e hoje a continuação de uma guerra tal seria o ultimato da destruição e do
aniquilamento de nossa terra. Um poder estranho ameaça a integridade do Império
e tão estólida ousadia jamais deixaria de ecoar em nossos corações brasileiros.
O Rio Grande do Sul não será o teatro de suas iniquidades, nos partilhamos a
glória de sacrificar os ressentimentos criados no furor dos partidos. Ao bem
geral do Brasil.
-
Concidadãos – Ao desprender-me do grau que me havia confiado o poder que
dirigia a revolução, cumpro assegurar-vos que podeis volver tranquilos ao seio
de vossas famílias. Vossa segurança individual e da propriedade está garantida
pela palavra sagrada do Monarca, e o apreço de vossas virtudes confiado ao seu
magnânimo coração. União, fraternidade, respeito às Leis e eterna gratidão ao
ínclito presidente da Província, o Ilmo. e Exmo. Barão de Caxias, pelos
afanosos esforços que há feito na pacificação da Província. – Campo do Poncho
Verde, 28 de fevereiro de 1845 – DAVI CANABARRO.
Logo após Manuel Lucas de
Oliveira lança outra proclamação, em nome de José Gomes Vasconcelos Jardim,
presidente que fora da República Rio-Grandense, na qual, depois de fazer o
elogio dos farroupilhas, conclui:
-
Resta lembrar-vos, Rio-Grandenses, que cumpre desviar deste momento em diante,
quanto seja capaz de eclipsar tanta glória, quanto possa desvirtuar vossos
feitos, baixar-vos de ambição, enfim, quanto possa obstar que vossos nomes
ilustres voem à séculos remotos com
aquele esplendor de que por tantos títulos, por tantas provas, sois dignos –
Dizei comigo – somos outra vez Brasileiros – seremos sempre idólatras da
liberdade constitucional – Campo em Poncho Verde. 28 de fevereiro de 1845 –
MANUEL LUCAS DE OLIVEIRA.
No dia seguinte, pela manhã,
em seu acampamento ordena Caxias a formação de sua força e manda ler a seguinte
proclamação:
-
Rio-grandenses ! É sem dúvida para mim de inexplicável prazer o ter de
anunciar-vos que a guerra civil que por mais de nove anos devastou esta bela
Província está terminada.
Os irmãos contra quem
combatíamos estão hoje congraçados conosco, e já obedecem ao legítimo Império
Brasileiro. Sua Majestade o Imperador, ordenou por decreto de 18 de dezembro de
1844 o esquecimento do passado e mui positivamente recomenda no mesmo decreto
que tais brasileiros não sejam judicialmente nem por outra qualquer maneira
inquietados pelos atos que praticaram durante o tempo da revolução. Esta
magnânima deliberação do Monarca Brasileiro há de ser religiosamente cumprida.
Eu o prometo sob minha palavra de honra. Uma só vontade nos uma,
Rio-Grandenses: maldição eterna a quem recordar-se de nossas dissensões. União
e tranquilidade seja de hoje em diante a nossa divisa. Viva a religião, Viva o
Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil. Viva e integridade do
Império. – Quartel General da Presidência e do Comando em Chefe do Exército na
costa do Santa Maria, campo de Alexandre Simões a 1º de março de 1845 – BARÃO
DE CAXIAS.
MIGRANTES PARA SANTA MARIA
Apenas dois filhos do imigrante Johann Jacob Lampert optaram para se
estabelecer na metade sul do RS
KARL LAMPERT EM SÃO MARTINHO
Karl Lampert (1826-1911) deve ter casado
com Catarina Kruel
Cremos que foram direto de Taquari para São
Martinho e registraram em S. Maria por não haver, no momento, cartório ali, nem
igreja evangélica
Anos mais tarde, Karl, esposa e a maioria
de seus filhos, vieram para Montenegro, Lajeado e Porto Alegre. O casal faleceu
em 1911 e está sepultado em Montenegro no cemitério evangélico.
E SEU IRMÃO MICHAEL LAMPERT
Michael (1817) também deve ter casado com
Katharina Butze em São Leopoldo, pois o primeiro filho do casal, Carlos, foi lá
registrado em 1843. Os seguintes: Klemens, Michael Adam, Jacob, Carolina,
Abraham e Adam nasceram
Verificamos que os dois irmãos e seus filhos
moraram ao mesmo tempo em Taquari e ambas as famílias devem ter partido em fins
de 1860 para a região de Santa Maria.
Santa Maria ainda deveria estar decadente, em
decorrência da Revolução Farroupilha: Campos despovoados de gado, imóveis
depreciados, proprietários e filhos mortos em combate, dívidas e impostos não
pagos, viúvas desamparadas, inimizades, decepção e pobreza geral, mercado
atraente para quem dispusesse de energia, dinheiro ou crédito para adquirir propriedades rurais
em ruínas à venda. Foi o que os irmãos fizeram.
Michael, voluntário, foi engajado nas
fileiras do exército Imperial em 7-5-1838 e lutou até o centro do Estado. Após,
foi-lhe determinado que voltasse às suas origens, juntamente com seu cunhado Cap.
Carlos Clemente Kersting e o irmão deste, major Ferdinand August Maximilian
Kersting, afim de, com demais voluntários locais, combater o banditismo
praticado por desgarrados, expulsos e desertores do exército Farrapo, que estavam
praticando assaltos, roubos e assassinatos na região de Dois Irmãos. Cumpriram o que lhes foi ordenado.
Vemos que Michael, no exército, lutou
durante três anos e teve o seu primeiro filho em 1843, antes do fim da revolução.
OMISSÕES
MANOEL
LUIZ OSORIO – Futuro Marechal e Patrono da Cavalaria era Tenente Coronel do
exército Imperial. Livro Farrapos, de Jorge Telles, pg 101. No livro História
Ilustrada do RGS, da RBS, na pg 122, destaca que Osório, Farrapo inicial,
repassou-se de volta ao Império. Lutou durante os dez anos da Revolução
Farroupilha. No Parque Osório em Tramandaí não encontrei qualquer referência.
Foi nomeado Ministro de D. Pedro II.
Dia 10-05-2011, Zero Hora publicou o mesmo no
“Túnel do Tempo”
TAMANDARÉ
– Futuro Almirante e Patrono da Marinha, foi oficial à bordo dos navios de
guerra do Alm. Greenfell, que evitou a tomada do porto de Rio Grande, sitiou os
republicanos na ilha do Fanfa e expulsou os Farrapos quando estavam tomando o
porto de São José do Norte.
COMBATE
DA ILHA DO FANFA – Encurralado pelo exército imperial e pela esquadra de
Greenfell, lutando bravamente por três dias e sem alimentos, Bento Gonçalves e
seu Estado Maior aceitaram de rendição oferecida por Bento Manuel. Seriam todos
liberados, desde que depusessem as armas e se comprometessem por palavra de
honra não mais entrar em luta contra o Império. Os soldados vencidos foram
mandados para casa e os oficiais ficaram soltos no acampamento dos vencedores.
Não confiando, Bento Manuel mandou vigiar Bento Gonçalves. Quando este mandou
para Piratini um emissário com determinações de guerra, Bento Manuel
interceptou-o e leu seu conteúdo. Mandou prender todos os oficiais e envia-los
como prisioneiros para o Rio de Janeiro, donde mais tarde se evadiram e
voltaram ao sul. Bento Gonçalves foi enviado para a prisão na Bahia, onde, por
intervenção da maçonaria, também posteriormente, fugiu e voltou a
Piratini.
NETTO
– O Tte. Cel do exército imperial Antônio de Souza Netto, proclamou a
república, sem consultar seus superiores imediatos, os monarquistas Cel. Bento
Gonçalves da Silva e Cel. Bento Manoel Ribeiro, autoridades máximas militares
no RS. Bento Gonçalves teve que aceitar o fato consumado, mas Bento Manoel
Ribeiro acabou trocando de lado na Revolução e ficou com o Império. Netto
assinou a ata do acordo entre os Farrapos, logo após Canabarro e foi à Poncho
Verde para fazer entrega do armamento e dos escravos ao Império, livro
Enciclopédia Rio-grandense, tema A revolução farroupilha, de Walter Spalding;
pg 279 e livro Farrapos – a Guerra que Perdemos, 2004, de Jorge Telles, pg.101.
Meio a contragosto, acabou aceitando a anistia geral.
No dia seguinte apresentou-se à Caxias, que
recebeu os comandantes Farrapos em seu acampamento no rio Santa Maria e também
fez a sua proclamação de paz, Sem qualquer dúvida, Netto foi o general que
gozava de maior prestígio entre as tropas da República. Desgostoso com o desfecho da revolução
emigrou para o Uruguai onde tinha propriedades rurais.
MANIPULAÇÃO
GARIBALDI
- Encontramos duas versões da Carta de Corso entregue no Rio de Janeiro: pg. 52
do livro Garibaldi e a Guerra dos
Farrapos, de Lindolfo Collor (1938) e pg. 22 do Garibaldi em São José do
Norte, de Elma Sant´Ana (2007):
......
cruzar os mares e rios onde trafegassem
barcos de guerra ou de comércio do Brasil, podendo apropriar-se DELES OU
TOMÁ-LOS PELA FORÇA DE SUAS ARMAS ....
.......... DE SUAS ARMAS COM O USO
DA FORÇA ......., alteração sutil do texto, escondendo desnecessariamente a autorização de captura de navio cargueiro e
de saque das mercadorias a bordo.
Os
livros Os Farrapos, 2003, de Carlos Urbim, pg. 89 e Anita Garibaldi,1999, de
Paulo Markun, pg. 96, repetem os mesmos
dizeres do livro de Lindolfo Coll
DESFILE
FARROUPILHA – Sempre o assisto com prazer, e vi, no ano passado, quando um
carro alegórico desfilava em frente ao palanque oficial, a “assinatura”
ostensiva, com uma grande caneta, das figuras que representavam David
Canabarro e Barão de Caxias, assim o
locutor anunciava, do acordo de paz jamais realizado.
A GRANDE BATALHA QUE NÃO
HOUVE
O COMBATE DE TAQUARI EM 8 DE MARÇO DE
1840
Em 1949 mudei de residência de
Lajeado para Bom Retiro do Sul - distrito do município de Taquari - por motivos
profissionais. Morei lá durante 12 anos. Meu filho primogênito é conterrâneo do
David Canabarro, Taquariense nato.
Por ser sede do município, eu iria
pelo menos uma vez por mês à cidade, para atender afazeres burocráticos. Tive
contato e fiz muitas amizades, entre eles com José Leite Costa, Engº Agrônomo,
filho do advogado Adroaldo Mesquita da Costa, mais tarde ministro da Justiça do
Brasil - e que também morava em Taquari.
Povo generoso e cordial. Só guardei
boas lembranças,
Em Bom Retiro do Sul, envolvi-me em
atividades ligadas às tradições gaúchas. Fui um dos fundadores do CTG Querência
da Amizade, em 1957, e seu terceiro patrão. Misturávamos cultura riograndense e
revolução farroupilha. Foi o início do meu interesse pela história gaúcha e que
nunca mais teve fim.
Sabedor do combate de Taquari achei
no Google a foto do monumento comemorativo e lembrei que estive há muito tempo
no local para conhecer a área dos Caramujos nos arredores da cidade, o Passo de
Taquari, a ilha do Passo Velho. Transpondo o rio em direção à General Câmara,
indaguei ao barqueiro o sítio exato do final a contenda.
MONUMENTO DO COMBATE EM TAQUARI
(GOOGLE)
Interessado numa relíquia, pedi ao
meu amigo José Leite Costa (o Zé), que tentasse obter uma arma encontrada no
rescaldo da refrega - uma garrucha ou uma ponteira de lança de cruzeta - e me
informasse o preço. Deu em nada.
Em 1961 fui morar e trabalhar em
Encantado e, algum tempo depois, o Zé se apresentou no meu escritório portando
um sabre de cavalaria sem bainha, “doado” por um morador vizinho dos caramujos.
Não esquecera a minha encomenda. Logo vi que o Zé comprara o sabre e não quis
cobrá-lo de mim. Era bem típico dos açorianos de Taquari.
Examinando o sabre, constatei que a
lâmina dele, “Solingen”, era mais grossa e mais pesada do que as demais que eu
tinha também da época farrapa (tinha quase o dobro da largura). Deveria ser
portada por um homem vigoroso. Os copos do sabre já com folga, demonstraram o
tempo de “serviço” da arma e não havia dúvida sobre a sua antiguidade. Pela
fonte e pelo aspecto, admiti a sua legitimidade. Vide foto.
Desejando escrever crônica a
respeito da origem do sabre e do combate de Taquari, procurei nos livros
históricos que herdei do meu pai, nos que eu havia adquirido e também no
Google, material histórico que orientasse a minha crônica. Com surpresa, constatei
que quando mencionado o combate, havia apenas frases esparsas e sem valor real.
Tentei contato com outros historiadores e recebi sempre a mesma resposta. Não
tinham nenhum conhecimento efetivo.
No Google, vi o nome do historiador
taquariense Riograndino da Costa e Silva (primo do Zé) e passei a procurar seu
livro – São José do Taquari. Consegui xerox do tema que me interessava.
O livro reproduz crônicas de Othelo
Rosa, publicadas no jornal O Taquaryense a partir da edição de 1° de julho de
1939, que mostrarão o roteiro a ser seguido em resumo por esta crônica.
Em Taquari e seus arredores, na zona
compreendida entre os arroios Pinheiros e do Moinho, no ano de 1840 o governo
imperial e os republicanos rio-grandenses mobilizaram os maiores efetivos da guerra
que, durante todo o decênio, estiveram face a face (pág. 193).
Em números globais: as forças
legais, sob o comando do Gal. Manoel Jorge Rodrigues, 7.000 homens; as hostes
republicanas comandadas pelo Gal. Bento Gonçalves da Silva, 6.000 homens.
O Império e a novel República
jogariam, no lance, cartada perigosa e decisiva. Bento tinha necessidade de
resolver logo a parada com os imperiais, que dia após dia aumentavam em número
e armamento suas forças e qualquer demora seria fatal.
Manoel Jorge não tinha pressa. O
correr do tempo estava ao seu lado.
Bento, ao lado de David Canabarro,
Netto e suas tropas (incluindo Garibaldi, Anita e seus marinheiros a pé),
chegou primeiro e escolheu um local favorável às suas armas, com um leve
declive à sua frente, a existência de um arroio e um mato fechado que garantia
seu flanco esquerdo. Posicionou seus três canhões à frente da infantaria, a
cavalaria na retaguarda (apta a manobrar) e se preparou para ser atacado pelos
imperiais. Manoel Jorge, prudente e acautelado, se posicionou à pequena
distância e, vendo a posição favorável do inimigo, preparou-se também para ser
atacado e ficou aguardando. Sua cavalaria, no momento, não estava em sua melhor
forma.
Bento vacila (surpreendido pela
inércia de Manoel Jorge), não desfere o golpe e adia o encontro para o dia
seguinte. Se sucedem pequenas escaramuças e combates de cavalaria. A noite cai
sem batalha. Ao madrugar do dia, uma cerração densíssima envolvia Taquari, que
só se dissipou às 10 horas da manhã. Foi então que os farroupilhas, tomados de
espanto, verificaram que o inimigo desaparecera. Indescritível o desespero no
acampamento farroupilha. A retaguarda dos imperiais ainda estava terminando de
atravessar o rio.
Bento manda carregar e ataca os
remanescentes entrincheirados na barranca do rio, sendo que eles estavam
sustentados por uma barca a vapor e navios a vela, com seus canhões
direcionados aos atacantes. Novamente surpreendido, Bento, em pequenas
escaramuças reage e, pelo número de mortos de cada lado - 201 Imperiais e 270
farroupilhas mortos - verifica-se que apenas pequenos grupos se defrontaram.
Número irrisório ante a possibilidade evidente de uma carnificina num corpo a
corpo generalizado.
Manoel Jorge, recuando, preservou
seu exército de um possível desastre. O desgosto entre os chefes farroupilhas
iria prejudicar-lhes grandemente a unidade de ação. Bento, como comandante
indeciso, foi responsabilizado e criticado asperamente.
Bento Gonçalves da Silva perdeu a
última oportunidade de um confronto “tudo ou nada”. Jamais se repetiria.
Bento recuou com seu exército para o
sítio de Porto Alegre. Canabarro e Netto
dirigiram-se para suas regiões na campanha.
A revolução seguiu seu curso natural
e até a paz surgir, ceifaria a vida de muitos combatentes.
Tentativas de paz foram realizadas,
mas havia um ponto inegociável pelos dois lados. Os farrapos queriam um acordo
entre dois países e o império considerava os farrapos como revolucionários
dentro do estado do Rio Grande do Sul. Não seria um país. Não tinha uma
constituição, fronteiras definidas e aceitas pelos vizinhos, não era
reconhecido pelos demais países, não enviara embaixadores nem os recebera, não
convocara eleições entre a população.
Somente em 1845 os farrapos (de má
vontade) aceitaram que seriam todos anistiados. Convocaram 26 oficiais do
exército farrapo que, de comum acordo entre eles, aceitariam a paz com os
imperiais condicionando que o Império atendesse uma série de condições entre
elas a libertação dos escravos que lutaram ao lado dos farrapos. O Império
simplesmente ignorou essa cláusula e nenhum farrapo reclamou. Podiam tê-lo
feito, mas não libertaram nem seus próprios escravos companheiros de luta.
A paz foi selada verbalmente e
documentada em 28 de fevereiro de 1845 por
declarações formais dos líderes farrapos David Canabarro e Lucas de
Oliveira, em nome de José Gomes Vasconcellos Jardim. Consideraram a luta
terminada e em 1º
de março, por proclamação do Barão de Caxias aos seus comandados, informando
que os revoltosos já haviam deposto as armas, aceitaram a anistia e estavam
novamente congraçados como súditos de S. M. I. Dom Pedro II.
Caxias determinou que os Farrapos
que se dirigissem ao Poncho Verde para entrega dos escravos e dos armamentos.
Netto inclusive.
PÁTRIA E
QUERÊNCIA
Guido Ernani Kuhn
A impressão que se tira, a cada
setembro, é que aqui no Sul o dia 20 tende a superar o dia 7. Não sei se por
causa da fétida lama federal, ou por outras razões interiores de cada peito
gaúcho, é visível que o evento regional cresce e até se prolonga em duração
(era Semana Farroupilha, agora já é quase Mês), em vibrantes manifestações do
civismo e da cultura do Sul. No sentimento do povo gaúcho, o amor à terra é
cada vez mais focado no Rio Grande, essa querência regional com sua marcada
cultura e o peculiar jeito de ser de sua gente, que tem hino próprio e o canta
com ardor. Esse pessoal que faz cavalgadas, será que as faria pelo 7 de
Setembro? Nossa cara e nossos costumes são diferentes, e há até peculiaridades
inconfundíveis na língua.
A
origem disso já tem 172 anos, apenas 13 anos a menos que o Brasil independente.
É até espantoso como vem crescendo entre nós o interesse por essa história,
iniciada a 20 de setembro de 1835, tendo por estopim, segundo relata o padre
Theodor Amstadt, um imposto territorial de 10 mil réis por légua quadrada,
decretado contra os latifundiários, para reforçar o caixa da cidade. A légua
quadrada media
Havia
outras causas bem mais fortes, ainda represadas, que se somaram no caudal da
revolta. Hoje, a paixão é tão grande que muitos gaúchos se incomodam com os
historiadores que têm versões desabonadoras à memória dos grandes heróis
daquela epopéia, como Garibaldi, Canabarro, o General Antonio de Souza Netto,
que foi quem proclamou a República de Piratini, a 11 de setembro de 1836, além
do próprio Bento Gonçalves, que foi o primeiro presidente. Entre outras coisas,
diz-se que a Paz de Poncho Verde teria sido uma farsa, uma rendição assinada
apenas pelos farrapos e nenhum representante do Império, salvando a pele das
elites farroupilhas, mas não dos escravos que estavam com eles.
O
levante dos farrapos eclodiu 11 anos depois da chegada dos primeiros imigrantes
alemães a São Leopoldo. O Império não tinha honrado os contratos com eles, e,
do outro lado, os fazendeiros faziam pressão política contra o progresso das
colônias, muitos desejando ter nos seus latifúndios a força de trabalho dos
imigrantes. O impasse chegou até a suspender novas imigrações, a partir de
1830. Sem alternativa e cercados de fúria, como caranguejos entre o mar e o
rochedo, os colonos estavam na linha de fogo, nas barbas do grande alvo que era
a Capital da Província. Não conheciam a língua nativa, a guerra não era deles e
sequer sabiam se a luta era do bem contra o mal, ou apenas uma disputa política
de poder. Dos que entraram na revolução, a maioria ficou do lado do Império,
liderada por Johann Daniel Hillebrand, um alemão que era coronel da Guarda
Nacional e depois também Diretor da Colônia de São Leopoldo. Outros, sob
pressões e ameaças, aderiram aos farrapos, entre eles Hermann von Salisch, que
por isso foi deposto da Direção da Colônia.
Todos
os colonos, inclusive os neutros, que eram maioria, estavam constantemente sob
o risco de invasão, confisco de bens, massacres, torturas, degolas e outras
formas cruéis de assassinato. Coisas que aconteceram tanto que, após nove anos
de guerra, a Colônia, com pouco mais de cinco mil almas, tinha 15 habitantes a
menos do que no começo. É um cenário que, mais tarde, se repetiria outras
vezes, de forma até mais cruel, como na Revolução Federalista de 1893. Para
tomar Porto Alegre, defendida pelos caramurus do Império, talvez tenha
faltado aos fazendeiros farrapos maior harmonia com os colonos. Com o campo e a
roça divididos, a Capital resistiu, e por isso até foi chamada de “Mui Leal e
Valorosa Cidade de Porto Alegre”.
A
história verdadeira é aquela que realmente aconteceu, mas talvez não seja exatamente
a história que temos para contar, que inclui versões e interpretações, o que
provoca as divergências. Afinal, isso não é uma simples soma de dois mais dois.
Seja como for, uma guerra é sempre horrorosa, principalmente quando corre
sangue do jeito que correu. Uma guerra nunca é limpa e nela não há santos. Sua
única regra é a falta de regras. Por isso, não podemos festejar uma guerra, nem
mesmo nos incomodar muito com o que descobrem os historiadores sobre ela. Mas
podemos lembrar os ideais que a motivaram, as lições que dela saíram, os
valores que a ela sobreviveram e os heróis que ficaram. É o que os gaúchos
fazem, com ardor, a cada 20 de setembro. Hoje, embora não tenhamos convívio
fácil na política e no futebol, é muito bom que estejamos em paz como gaúchos e
brasileiros, porque pelo menos nisso estamos todos do mesmo lado. (12/9/2007)
Fonte:
Gazeta do Sul – guido@gazetadosul.com.br
LEANDRO LAMPERT
Historiador
leandrolampert.blogspot.com.br